quinta-feira, 31 de maio de 2007

os joelhos de Inês, à lareira


as chamas viraram brasas, felizmente. é bom o seu calor, não faz feridas como as chamas soltas, inconstantes e alterosas. das brasas todos sabemos: podemos chegar o banco para mais perto da lareira, ajeitar a samarra ou o xaile a proteger as costas e, olhos fixos nas mudanças de cor das brasas fazer conversas de lareira, dizem que das melhores no Inverno. tu aí e eu aqui, cada no seu banco e no braseiro comum, esta ficção de escrevê-lo e confessá-lo, soltar rédeas aos desejos e cada um contar de como comia o outro, canibalismo de quem está farto da fome das iguarias de sentimento, carnívoro de sentires.

vem um calor bom, as faces estão coradas e nas mãos estendidas em carícia respeitosa ao calor do fogo há o brilho da pele mais intenso, vêem-se tendões e veias, dá vontade de chupar-te os dedos. há momentos em que nestas epístolas me sinto um pedinte de afectos e não gosto disso. tenho vinte dedos e uma pila, rabo, boca e nariz à unidade, dois olhos e duas orelhas, tudo usado e com uns anos em cima, dedos amarelos do tabaco incluídos. um formato em padrão e à época, e com um software exclusivo sempre com bug's e páginas 'agarradas', tanto programa útil que armazenei na vida e nunca os utilizei nem sei utilizar, o mundo acaba logo a seguir ao Word, tão grande que ainda não se acabou. seduzo pela letra e sou fraco galanteador na oralidade, acabo de te confessar em conversa de lareira, olhos nas brasas. teus olhos, como me perderia já a falar deles... mas não, qu'o fresco que vem lá de fora não aconselha a despir a samarra e tentar roubar-te um beijo, deixe-se correr a conversa morna, esta preguiça que vem do calor, das tuas mãos que brilham àquela luz e, agora, os teus joelhos bem nítidos, ora que te puseste sentada de lado para melhor olhar para mim. falas-me. estás a perguntar-me coisas e eu, ou porque não sei do que falas e recuso-me a pensar nisso, ou pela maior razão do novo fascínio surgido, os teus joelhos, não te ouço e não percebo patavina, alterno um sorriso concordante com um ar intrigado e super atento, depois em meditação profunda apoio o queixo no punho e olho.... os teus joelhos. assim, as pernas contraídas e cruzadas nos pés mostram a elegância do teu esqueleto, joelho e fémur mais em pormenor. ossudo aquele, prometedoramente longo e almofadado este (está a ficar calor; vou tirar a samarra)

nesta lareira, nesta casa, quantos casais de quantas gerações se sentaram aqui, a olhar troncos que estalam e brasas que aquecem, quantos bancos foram arrastados na procura do conforto um do outro? o passar pelas brasas sonhadoras, aqui literal. certamente muitos e houve Cinderelas e Marias nesse teu canto e com esses joelhos, há aqui um Carlos que olha Inês como outrora houve quem fosse que houve e olhou quem estava, mostrando ela os joelhos tal como tu agora com as pernas das calças arregaçadas. adivinho-te no sorriso indisfarçado que já descobriste que te miro à sucapa, que não estou aqui e já venho. não posso evitar rir-me, apetece-me rir e rio-me, está calor e os teus joelhos são tão bonitos como a covinha que fazes quando ris, como agora, ei-la! raacccc e raaccc, ambos os bancos se arrastaram milímetros ao mesmo tempo e que se multiplicaram numa gargalhada cúmplice e encantada, no abraço ao calor de brasas que estão em ponto, óptimas, um arco íris privado de tons fortes, quentes, calores que nem as carícias que se trocam suavizam, choques de joelhos o teu nu e o meu não mas como se o estivesse, estou, estamos nus e há quanto tempo, não o negues Musa minha...

é um refresco a que sou sôfrego, a tua boca. estamos lambuzados, contentes que nem crianças com este maravilhoso brinquedo, o desejo, a fome sexual. busco-te um peito e na primeira carícia sinto-te o arfar no meu ouvido, a tua mão que me revolve a nuca e excita-me, os teus dedos que mergulham à procura das minhas costas, carne, carne como eu sinto agora o macio a tremer da tua barriga, solta que está a blusa para permitir à mão encontrar melhor os teus seios, que gritam por elas. damo-nos carinho. beijamo-nos, os corpos colando-se e descobrindo-se, a excitação sexual já revelada e imparável. acaricio-te o rabo profundamente, cravo na nádega os dedos e puxo-te, colo-te mais a mim para sentires a minha excitação, gritando por liberdade e exercício do prazer até à exaustão. a minha mão pesquisa dentro do cós das tuas calças simultâneamente à tua, que, impaciente por acariciar-me sobre a roupa, luta com o meu cinto e botões para sentir o meu músculo quente, inflamado pelo sangue e pelo calor de ti.

depois vem o decoro. nada mais há a contar de estórias de lareira assim; há a mitologia e a esperança em, um dia, outro e outra à mesma lareira assim se incendiarem. smack, Inês

quarta-feira, 30 de maio de 2007

quadro de Senhora Após o Banho

"Olá Inês!

Não queres 'escrever'? contar de como é bom piscar o olho, ser galanteada? Tu Musa, és a rainha do meu quotidiano imaginário: sem ti ele não existia, prime, e como sobremesa à vidinha haveria dieta sem o profiteroles perfeito, no ponto, que é loar-te em dedos excitados. Anda, conta de ti, de como desliza na tua pele húmida o vapor d'água quando termina o banho e os mamilos estão rubros de excitação. De como é agradável passar as mãos no cabelo e fechar os olhos, sentindo o arrepio das gotas deslizando nas costas, juntando-se para mergulharem num fio entre as nádegas, vermelhas pela excitação térmica. De como os músculos estão serenos e dengosos após a massagem do chuveiro e ansiosos por uma carícia que não lhe dispensas, enquanto a toalha te percorre a pele, cheirosa e bonita. Conta, musa, conta-me de ti após o banho, que sonhos aquelas paredes poderiam contar se tivessem lábios para te beijar, como eu, senhor do beijo escalado nas paredes do teu Castelo e do meu teclado mas omisso do quadro de Senhora Após o Banho, belle-époque da minha Ilusão. Do cigarro enquanto o espelho devolve o olhar crítico, observador de pontos negros e da patine dos anos, a ternura da ruga beijada em ósculo de homenagem à intemporalidade da sedução do corpo feminino. Conta-me disso, fala-me de ti. Nua ou vestida, no despertar ora resmungão ora sereno, do sol que te cumprimenta quando passeias à cidade a tua graça felina, conta-me do erotismo de gostar de pensá-lo e, inexplicavelmente aos cegos, de vez em quando sorrires ao recordar, imaginar... como eu que te espreito à fechadura vendo-te lamber o corpo no acarinhar da toalha, minhas mãos transmutadas que imaginariamente te acariciam. Conta, anda..."

segunda-feira, 28 de maio de 2007

sábado, 26 de maio de 2007

Euro Milhões

Parece que a estatística aponta o ano 3.024 como aquele em que o Euro Milhões já, matematicamente, saiu a todos os portugueses.
Apetece-me dizer saiam da frente, qu'isto vai ser um bocado chato para as cinzas dos últimos.

sexta-feira, 25 de maio de 2007

Semana Africana em Santarém*

África

"Quando ontem a Milly me telefonou a recordar-me o compromisso de, hoje, ler umas palavras sobre nós e África, estremeci.

Primeiro porque nada tinha alinhavado pois esquecera-me completamente. Depois, enquanto mentalmente ia coleccionando imagens do álbum e pensando em como me ia desenrascar, os olhos encheram-se de cores, vi-me e li-me como nos calções e boné – obrigatório até eu perder os suficientes, vá-se lá saber porquê!..., a pasta escolar debaixo da árvore e de bruços em volta dos berlindes, os carrinhos com um botão colado com chuinga, deslizando invencíveis na borda do passeio. Das mangas roubadas, do tilintar das pedras que caíam nos telhados dos vizinhos, às vezes até no do dono da mangueira e do correr pelos caminhos estreitos, labirintos de areia quente e paredes em caniço que davam para largos onde havia uma cantina que vendia gelo-doce, à porta mamanas a vender amendoim torrado, amendoim com açúcar, maçarocas assadas.

Provavelmente vendiam mais, mas do feijão e das latinhas de azeite Gallo de um litro não me lembro, eu recordo é o sabor das mangas roubadas, dos jogos do paulito e dos pavilhões ao ar livre que eram os passeios depois de jantar, fabulosos jogos de báskett nas melhores tabelas do mundo, aqueles aros de barril pregados onde desse jeito, os jogos dois-a-dois em que se fintava e metia-se golo no buraco da árvore, as noites quentes em intermináveis conversas sentados nos muros, descobrindo a vida e os seus mistérios, eu penso-me quando penso em África vejo o caniço e o cimento, a cidade. Ao pensar ‘Africa e nós’ eu penso-me em miúdo, nela.

Cresci na cidade mais bonita de África, tantos o diziam, e eu que a amei tanto que só hoje o percebo, conheci-lhe sabor limitado, quase todo urbano. Amava percorrer aquela cidade na minha motorizada, o lento passear sob as ramadas das acácias e dos jacarandás, o longo ronco do motor em avenidas sem fim, camisa aberta ao vento e a todos os cheiros que ele, pródigo que era, me trouxesse. Cresci em harmonia, infelizes quedas em curvas onde o óleo dos machibombos o induzia, mas o alcatrão era suave, tanto que se derretia quando o sol africano explodia, naquele seu apogeu que tem o fim mais belo do mundo, o pôr-do-sol no sul de África.

Era um momento sagrado do dia, uma intenção que só não se cumpria se uma emergência acontecesse ou a preguiça encontrasse outra desculpa: ao cair da tarde, no jardim fronteiro ao imponente liceu principal da cidade, na zona alta e lá em baixo a baía e o desconhecido no horizonte, mesmo aos pés e no fundo das barreiras o final da baixa da cidade, a Feira – esse local mágico que acontecia uma vez ao ano e onde se enchiam sacos de plástico de sonhos com rodas para meses, se comiam óptimas bifanas à borla, também o muito verde de matas mantidas para futuros jardins, já um lago e barquinhos, namorados de mão dada.

O Sol, àquela hora e visto dali era mágico, havia labaredas nas nuvens e a água tudo reflectia, o círculo de fogo gritando a paleta de emoções de dizer-se África. Éramos sacerdotes dum ritual irrepetível: também com marca de de época, mas a beleza do beijo final do sol à baía e à cidade era uma carícia especial, e a tela só perdia em beleza para as miúdas da cidade.

O mundo ajusta os seus ciclos e o colonial fechou, o longo tabuleiro mundial ajustou peças e, na revoada formada, fugiu-se-me o pôr-do-sol. Sei lá se fui colono estatisticamente, eu que nasci ‘cá’ mas amei crescer ‘lá’!... ‘colonialista’ em termos de definição clássica não fui, fui tão parvo como me apeteceu e tive quantas paixões como as que me lembrei, joguei à bola no caniço antes de saber andar de mota, cresci feliz à beira duma avenida famosa numa ilha de cimento que me deixava mergulhar as sandálias na areia mole, roubar mangas ou comprá-las, espreitar as prostitutas que aguardavam os militares num famoso dancing-bar quase em frente à minha casa, atirar sacos de água aos machibombos pelas portas inexistentes, e certeiros rolinhos de papel, dardos meticulosamente preparados e projectados por tubos de plástico que se arranjavam ‘nas obras’, foi numa cidade africana que os meus papagaios subiram ao céu, impossível esquecê-lo.

Hesito muitas vezes na distinção entre saudosismo e nostalgia, confesso que receio cair no mar morto do primeiro, e interrogo-me sobre a segunda. No meu caso e no de muitos de vós, quando “pensamos África” associámo-la com duas, três décadas atrás, e tanto que esse tempo é.

Nós não somos os mesmos, se fôssemos outra vez miúdos não tínhamos papagaios senão de plástico, e nas praias do Verão. As pessoas têm todas telemóveis para se chatearem continuamente umas às outras. Também lá, ao que ouço. Então porquê África diferente, porque este sorrir que se formou quando, findo o telefonema, comecei a escrever? sabem, disse-o à pouco, e seria poético demais dizer que a diferença está no por-do-Sol: isso é pouco para contar do dormir numa praia, da interminável savana e do cheiro das queimadas, de como um romance de aventuras sabe melhor lido em África, terra mágica e de mistérios.

Por isso acho que tenho direito à saudade de tê-lo visto naquele jardim e ter-me apaixonado pelas suas cores, ter sentido África no ar quente que me deu o oxigénio, e nas chuvadas de balde das primeiras desilusões nos grandes amores. E à nostalgia de mim, também; da felicidade de ter crescido assim, olho África e o meu passado em harmonia, deixo-a invadir-me pacificamente o quotidiano quando o olhar vagueia, moureja por ancoradouro que traga um sorriso ao crispado dos anos, há um suspiro de memória e um salivar pelo cheiro do milho nas brasas, pelo sabor duma manga verde com sal, há o olhar que se perde e nunca mais se encontra, há esta coisa boa de, aos cinquenta e tais, recordar o jogo do paulito e do n’tchuba, aquele das covinhas e das pedrinhas, o capim que bordejava os carreiros que haveriam de conduzir a algum lado, o cheiro da terra húmida após chuvada.

Não sei se lá voltarei, se calhar para aquilo que fazem os elefantes quando abandonam a manada. A vida trás raízes múltiplas, e quando penso num regresso à África onde vivi odeio imaginar-me turista, um tontinho de máquina fotográfica na mão fotografando as memórias, tão vagas que não reconhece tanto como julgava e, não tarda, está a fotografar cinemas fechados e cafés que hoje são lojas de telemóveis, catedrais, a comprar postais ilustrados.

Mas há cá um canto que bule, que volta não volta enrola o pensamento nas mãos e aquece-o, são os momentos em que a herança cultural africana que me deu um bafo em miúdo espreita, tentadora. Estou bem com o meu passado, olho-o com ternura até. Tão igual ao de qualquer outro miúdo, seja em Santarém seja onde for, com a diferença contada, a cor do pôr-do-sol e a avenida com a areia solta ao lado, o bar em frente e os pirolitos e o gelo-doce, o aventurar para fazer quase duzentos quilómetros em areia numa motorizada para ir a uma praia, o dormir ocasional num recanto ouvindo os sons da noite, poderosos no imaginário. Isto que foi mais-valia do meu início consciente, porque não buscá-lo de novo, nas novas realidades, tal como é novo o Outono quando a idade nele nos mergulha.

Obrigado África, pelo que me deste e continuares no meu imaginário"


Santarém, 25/5/2007"
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* no cine-teatro Sá da Bandeira, às 17 horas

quinta-feira, 24 de maio de 2007

II - Disneylândia e gato ausente

".... olhou-a, os olhos brilhando de desejo, os lábios secos e as mãos crispadas, os músculos tensos, o animal macho emergindo, já rugindo no longo murmúrio que o seu corpo gotejava, ansioso pelo calor corporal sexual. A atmosfera do quarto, àquela meia luz que as discretas cortinas corridas criaram, fazia-a mais bela se possível, a alvura do seu corpo e a ternura ávida do seu sorriso eram os focos, o íman, seu único destino naquele momento em que o mundo se apagava e o zumbido dos carros na avenida, lá tão longe, ainda parecia mais distante.
Não falaram. Para quê? Os corpos gritavam, os braços dela erguidos, suplicantes pelas suas carícias, diziam tudo. As palavras seriam irritas pois só os beijos falavam, no seu húmido calor que incendeia e reincendeia, adormece passados e torna os presentes névoas, nuvens onde se flutua. Os corpos foram glorificados, sugados, lambidos, beijados. Os sussurros ciciados elevavam o prazer em vagas, as mãos eram poucas para sentir, agarrar, acompanhar o desejo e os lábios que, esses, faziam a via sacra dos odores e dos sabores, as línguas sugavam-se e os lábios sorriam, húmidos, brilhando em prata à luz dos corpos que ardiam na fogueira do festim da carne, os poros dilatados para libertarem e absorverem os fluidos, os cheiros, o sorrir que os olhos contavam.
A tarde correu molenga, as carícias e a ternura moderavam os ritmos sapientes, e a fricção corporal íntima soltava-lhes exclamações incontroladas. Ardiam no fogo que tudo lava e descobre, expõe o animal ora sedento ora ronronante, solta o sorrir simples das coisas boas, primitivas, até risadas francas e libertas soaram enquanto os membros inventavam fugas, alternativas, vias, permitiam aos corpos púbicos afundarem-se um no outro, radiantes, felizes, os egos feitos esponjas e, gulosos, sugando as carícias como tesouros, os músculos em espasmos e contracções, o beijo terno autorizando.
Foi mágico. As pernas, ainda enleadas, repousavam, o peito num afã de grito subindo e descendo, oxigénio do viver. Os lábios formulavam beijos e os olhos davam-nos, à claridade que deles voava em brilhos incandescentes juntava-se o aroma macho e fêmeo que pairava e eles absorviam como o complemento do momento do grito, dos dedos cravados em pedido brutal por mais! mais!, dos olhos explodindo em entrega, raiados pela loucura dos amantes, o espasmo corporal, o grito e o desespero do abraço, depois as gotas de suor venceram e vergaram-lhe os troncos, os corpos prostraram-se e os olhos abriram as portas da felicidade, semi-cerrando-se enquanto os últimos raios da realidade fugiam, o quarto e a cama, a janela e a luz, o nada bom inundou-os e a fome saciada adormeceu-os.
Sorria assim o viver quando, em estrondo, a porta abriu-se violentamente e um pincel de violência traçou naquela tela de amor traços brutais. O estremecimento deles, aquele acordar súbito e de terror, foi abafado pela visão das armas nas mãos, os dois adultos que, junto com a criança, tinham violado a mais bela intimidade que lhes dourara o viver. Em inconsciente defesa mútua abraçaram-se, em debalde tentando ocultar o brilho das suas intimidades assim reveladas, ofendidas, ameaçadas pela brutal invasão. Os protestos, débeis, silenciaram-se perante o esgar das máscaras humanas, os revólveres erguidos como a arma que são e não se lhes acredita num filme ou numa notícia.
Surpreendentemente quem parecia comandar o trio era a criança. Teria uns pequeninos anos, proporcionais à fragilidade da sua figura, e envergava roupas a condizer com a idade presumida, nos caracóis loiros uma fita vermelha, ligeiramente solta e precisada da ajuda dum adulto. Porém, quem lhe observasse a face, aliada às palavras que proferia numa linguagem estranha e que não se parecia com nenhum linguarejar que eles conheciam, percebia em estupefacção incrédula que o invólucro era apenas isso, havia um ser alienígena ou diabólico na posse do corpo infantil, cujos bracinhos rechonchudos indicavam ordens, os olhinhos castanhos revelando uma atenção e dureza maníacas, estranhas, em nada parecidas com qualquer outro olhar que recordassem, e isto assustava mais que as armas quando ambos de tanto tomaram realidade.
Que se passava? Quem eram? Que lhes iria acontecer, o que queriam? (...)

quarta-feira, 23 de maio de 2007

Methisfólis e Maddy (incompleto)

Comecei a escrever apenas pelo prazer de escrever, sem norte ou ideia além da de esticar os dedos. Saiu assim, mistura de encontros clandestinos e gatos solitários, uma criança desaparecida que é encontrada, um olhar ao íntimo nas vésperas dum net encontro. A continuar se a ele voltar, dizem os pontinhos entre parênteses. Nas várias facetas merece final feliz, o gato e Maddy incluídos, eu também, mas não sei se há lenha que chegue para aquecer tanta felicidade.
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Sentada numa mesa de canto do bucólico ambiente do bar do hotel àquela hora, nos dedos nervosos rolava o cigarro enquanto se perdia em reflexões tardias pois, facto, comparecera ao encontro. Na coluna de fumo lia o passado, nas coxas sentia o formigueiro da excitação. Claro que era 'errado' e que não devia estar ali. Mal se conheciam e ele era casado. Olhou em volta mais uma vez, no receio de ser reconhecida. Quando entrara não tirara logo os óculos escuros, como pretendendo anonimar-se perante o mundo, provavelmente escondendo-se dela própria. Há quanto tempo o fazia... Depressa mudou de ideias e eles olhavam-na, pousados na mesa, baixa e com o tampo em vidro, madeira sólida e anónima, decoração standard tal como o toque que dera aos olhos e aos lábios quando fora à toilette após pedir o café, no resto na chávena que também a olhava emparceirada aos seus disfarces, os óculos de sol e o maço de tabaco, tentou descobrir borras que lhe adivinhassem o futuro, principalmente que lhe contassem das razões do passado que lhe davam aquele momento de embaraço e de excitação, um 'date' marcado para bar d'hotel, sexo envergonhado disfarçado em e-mails de ardores que lhe conduziram o rubor da aventura àquele momento e local, à névoa que nada lhe contava e às borras ausentes que explicassem os tantos porquês que dessem luz e lógica racional à decisão que tomara: estava ali, comparecera.
Ele telefonara-lhe do rush do trânsito dizendo-lhe do seu atraso, sussurrando-lhe amores mas na voz tilintado o medo por ela desistir a alego do atraso e a irritação pelo engarrafamento que o aprisionava por, já soara entre os irritados condutores que saíram das viaturas, impacientes, e as rádios davam eco constante da notícia do dia, provavelmente razão de atenção nacional e mundial mas evidente incómodo para todos os que sofriam pela interrupção do trânsito nas avenidas centrais da baixa da cidade, face à mega operação policial que decorria a poucos quilómetros dali: a pequena Maggie, a adorável criança inglesa que mobilizara o mundo e todos os corações na sua busca e desejos de ser encontrada 'sã e salva' fora localizada há menos duma hora num hard-rock café, na companhia dum casal de meia idade e pronúncia estrangeira que, confrontados com a suspeita e depois a ira popular, o pandemónio que se estabelecera e os gritos aflitos da menina, agarrada ao pescoço da 'mãe' gritava que queria sair já dali e ir à Disneylândia, tal como lhe prometera o pappy, emboscaram-se os três no primeiro andar quando, na confusão estabelecida - contara uma jornalista mais afoita e afogueada e que fora das primeiras a chegar ao local, não se sabe donde soou o tiro e quem o deu, após a debandada ninguém estava ferido e desconhecia-se se nos ora barricados havia sangues perdidos e a lamentar, quem sabe se uma vida em perigo e Deus haja que não seja a menina...
Afastou esses pensamentos com um gesto rápido e a coluna de fumo encontrou novos caminhos, mais largos qu'as estradas onde o seu desejo nascera, navegara a vela solta e, finalmente, em corrente irresistível a conduzira ao bar do hotel, ao encontro ora atrasado. Fora... buscava a palavra mas hesitava em arranjar sinónimo para o vulcão de emoções que nascera após se terem conhecido pela maior agência sentimental do mundo, a Internet. Não era uma habituée, utilizava-a profissionalmente e para correspondência privada, pouca que nos seus círculos de amizades poucos se tinham entregues a tal paixão - como agora aceitava que era, a suave droga provara-a e gostara do sabor, arregimentara-a para serões que se esticaram a madrugadas, olheiras e muitas, muitas emoções que há tanto estavam guardados no canto para reparações, e tudo nascera dum acaso, como sempre...
Ao princípio fora o verbo, como na lenda. Num mail trocado em razões de serviço, numa manhã em que vira luzes novas no céu da primavera nascente e encantara-se com os pormenores quotidianos àquela luz, enquanto fizer a viagem de autocarro entre a casa onde vivia há três anos, só com o seu gato, Methisfóles, o único animal masculino que tolerava à sua intimidade desde o divórcio, e as horas diárias de solidão compartilhada, lá na agência de viagens. Nessa manhã e sabe-se lá porquê, num mail qualquer que confirmava uma reserva de já não sabia o quê, acrescentou duas linhas que falavam da beleza das flores e das pessoas, do Sol, o céu, contou como o dia estava lindo e de como se sentia feliz. Fê-lo por impulso, arrependeu-se mas claro que já era tarde e o mail assim seguira para um destinatário que, antes do arroba, tinha um nome que lhe era completamente desconhecido. Fora como abrir uma represa, e hoje 'antdinis' bailava em letras de fogo na sua mente quando, mal chegava a casa, corria para o mais recente intruso, o computador, seu companheiro e confidente dos silêncios que albergava nas rotinas de serviços mínimos à existência, á verdadeira vida, aos arrepios e à pele-de-galinha, aos lábios secos e a língua húmida e suplicante, aos olhos que, ávidos, corriam à caixa de correio electrónico na busca de mais um mail, mais palavras de tentação, de incêndio mas igualmente de aplacação aos seu novo imaginário que, virtude do romance, lhe enchia agora as antes monotonias com sonhos e fantasias. A elegância no verbo conduziu-os a uma dança que apagou o mundo.
Depois do verbo houve a carne, e ela falou de forma rude, brutal, inesperada a quem nem a saudade lhe associava. Se dos meses antes do divórcio apenas tivera sexo uma vez com o ex, numa estúpida mas desculpabilizante última 'tentativa de reconciliação - quase que se podia considerar de praxe ao que ouvia a amigas que passaram a sinecura, no longo depois até agora afastara pretendentes, irritara-se com um colega mais insistente e dera-se em lingerie exclusivamente ao gato, e às vezes até menos qu'isso, no tempo do calor que bate a todas as noites sem saber de companhias ou seduções: de 'homens' considerava-se vacinada, abstémia, ouvia com indiferença referências pouco subtis das amigas, círculo que foi rareando por ela nunca aceitar convites de amigos que ela lhe traziam, acreditando-a em carências que, na verdade, não sentia. Até que...
Chegava a envergonhar-se, só em pensar em como a paixão explodira em actos que, antes, lhe eram inimagináveis. Guardava todos os mails trocados, imprimia os dele e lia-os na cama, nas noites mais agitadas buscava os mais sedutores e masturba-se, os pés enrodilhados nos músculos tensos, o frémito subindo e fazendo os dedos morderem os lençóis onde, àquele momento, caía a folha de letras em fogo, as palavras e a tentação, o suspiro de êxtase quando sentia o estremecer do conforto corporal, os músculos relaxavam e ficava quieta, olhos fechados, os lábios pronunciando a longa palavra incompleta do prazer. Methisfóles não aprovava, lia-o nos seus olhos que a fixavam interrogativos enquanto ela deslizava na ilusão. para ele a vida era fácil, sabia das gamelas de água e biscoitos, havia a longa preguiça que o levava dum canto à outro da casa, às janelas, ao enrodilhado no seu sofá preferido, ao desprezo que votara ao intruso após a primeira curiosidade e cheiros, o computador.
o telefone tocou: ele. Atendeu em gesto rápido, já impaciente com a demora, a sala, a televisão que não havia para saber novas da Maddy, o barmen que a olhava como lendo-lhe intenções, as entranhas do café que nada lhe diziam das razões. Sim. Sim. Estava a estacionar num parque próximo, em cinco minutos estaria lá: 'amor, só mais um momento por favor...'. E a menina? - não se conteve e perguntou. Que não, continuava o cerco, disse que ainda se dizia na rádio. Polícias especiais guardavam a zona e vigiavam o prédio do café, aguardava-se a chegada de altas autoridades e de psicólogos, especialistas em situações de raptos e de proto-suicidas. Nada mais sabia, mas logo logo estaria ali, estariam juntos. Quando desligou pensou na síndrome de Estocolomo, a famosa, e da mais incógnita e ainda sem nome que scapasse ao calão e que lhe subia pelo corpo e a fazia arfar, ligeiramente, a expectativa do encontro iminente que lhe deixava os lábios gretados de ansiedade. Passou os dedos pelo cabelo, em mais um último jeito. A mente resfolegava, recusava-se a pensar, a triturar os factos. Assumia só com débeis protestos que o corpo mandava e tinha as rédeas da situação. A carne estalava de desejo, eis e apenas, p'ra quê complicar... Refugiou-se nesta abstracção e acabou por decidir pôr os óculos, que ocultassem os seus olhos que não largavam a porta e não contassem do fogo que neles ardia, não revelassem da noite mal dormida e das voltas na cama, mais longa e só que nunca antes, já de tempos imemoriais...
Eis que



(...)

segunda-feira, 21 de maio de 2007

Luz


O fogo intenso, quente, ilumina as árvores e revela as seivas, os galhos em brasa, os corpos beijados pelas chamas, troncos, nós, ramos, o nu àquela luz. A chama intemporal da pele quente pelo abraço mordido, lambido, o silêncio húmido do beijo que não apaga mas sim incendeia, a eterna fome de fogo e ternura. O arrepio das chamas mais íntimas e o cérebro iluminado pela única luz, sua lareira privativa quando o sussurro animal emerge e em carícias se brilham, os olhos em fogo e na pele o calor que vem dos corpos que ardem na floresta dos prazeres.

O impossível possível enquanto as chamas galgam todo o horizonte e tudo o mais cega, os corpos empolgam-se em de dois fazerem um, um grito, o maior porque de dois num, duas luzes que explodem quando os corpos, os troncos, cedem à violência das chamas e caiem, quebrados; o grito e o beijo-mor no enlace final, às chamas sucede um manto de névoa e dos olhos escorre a ternura que sobrou. O crepitar agitado da memória do fogo, dois fios de suor que deslizam em galhos ainda enlaçados pelos olhos, esses que viram as chamas e as lamberam, o impossível possível.
.....
Também poderia chamar-lhe ‘borralho’, mas gosto da palavra Luz.

domingo, 20 de maio de 2007

3 vezes

o nervoso miudinho
de me ter zangado com a rima,
fez-me enviar, iguais
três mails dizendo o mesmo,
três vezes mais um poema.

é assim:
estranhas situações ocorrem
nos versos da cyber poesia.
até calha dizer, três vezes,
qu'esta tarde armei-me
em poeta de domingo.

três vezes, o mesmo.
coisas que acontecem aos sonhos
feitos em computador
o programa segue dentro de momentos.

sexta-feira, 11 de maio de 2007

as estantes nos jardins

Esta notícia deprimiu-me. Pois... não é 'depois' mas sim 'pois' que escrevo, um baque de «quê? de que se fala? ah, pois, já nem me lembrava...»
Num jardim adormecer e envelhecer olhando essa enorme estante onde as lombadas se chamam memórias. Estranhar o Tempo, tão traiçoeiro na falsa lentidão com que corre e faz voar as páginas, e num súbito uma foto uma frase um nome dá um flash e puxa uma recordação, "ah, pois..." Envelhecer num jardim, rima de livros arrumados nas estantes e um embaraçador fio de baba rolando em queixo certamente de barba rala, descuidada na lentidão das tardes, no corpo o aconchego dum sobretudo sobrevivente a invernos e outros escritos; tudo pantufas quentes quando num repente se sabe duma notícia e, 'capa na mão', pensa-se que foi há tanto e há tão pouco, tempo já arquivado em estante passado, adjectivo da família de envelhecer e percebê-lo num repente.
Estou a falar de emoções. Esta notícia deprimiu-me, ainda havia um luto por fazer.
Adenda: o Luis Novais Trigo, do Tugir, dá novas sobre o lançamento.

Charlôt

e-mail recebido agora mesmo, boas oportunidades a divulgar:
UMA MÃO CHEIA DE CHAPLIN
DE 23 A 31 DE MAIO 2007
NO JARDIM REPÚBLICA EM ALMEIRIM
Este ciclo de cinema planificado para ser exibido ao ar-livre é organizada pela Câmara Municipal de Almeirim e tem a sua programação assinada pela Círculo Solar- Maternidade de Ideias. Inteiramente dedicado ao génio de Charlie Chaplin os cinco filmes que enchem esta mão, demonstram bem talento do autor-total. Todos os filme apresentados são realizados, musicados, interpretados pelo próprio Chaplin.
O Jardim República, fica no centro de Almeirim. Charlie Chaplin justifica a viagem e Almeirim vale a visita. A entrada é livre.
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PROGRAMAÇÃO:
SESSÃO DE ABERTURA - Quarta-feira 23 de Maio 2007, 21:30h * O Miúdo – 68' – 1921 – filme mudo
Quinta-feira, 24 de Maio 2007, 21:30h * A quimera do Ouro – 92'–1925 – filme mudo
Sábado, 26 de Maio 2007 , 21:30 *O Circo – 96' - 1928 – filme mudo
Quarta-feira 30 de Maio 2007, 21:30 *Tempos modernos – 83' - 1936 – filme mudo
SESSÃO DE ENCERRAMENTO, Quinta-feira, 31 de Maio 2007, 21:30h * O Grande Ditador – 120' – 1940 – filme sonoro

quinta-feira, 10 de maio de 2007

Honorato e Fidelina

'Honorato' e 'Fidelina' têm tido vida própria e pelos net-grupos os seus autores de vez em quando deixam registos bem humorados acerca do peculiar casal, ele (eu) um pobre desgraçado reformado da Polícia Judiciária e que faz uns biscates como dectective particular, ela ('ela', a desgraçada infiel!) uma matrafona que, descobriu-se, andava a cornear o Honorato com o compadre Ernesto e agora anda com a mala por Malta, ingrata emigração, vidé brasileiras e ucranianas por cá.
Nos últimos dias tem sido o 'Honorato' o maior contribuidor para a saga, e, sem falsas modéstias, ainda não falhou um tiro e tem limpo a vizinhança toda, compadre Ernesto e um entregador de ppizas incluídos. E mete canibais e uma ex-vizinha que foi sindicalista nos inesquecíveis tempos da Comissão para criar o sindicato das prostitutas, há can-can e outras coisas. Devagar devagarinho, para não acordar o Honorato que dorme à janela o sono dos justos e cornudos, irei aqui metendo 'episódios', sem que o sejam formalmente pois a continuidade é aleatória. Está dito, brevemente o primeiro desta 'série'.

terça-feira, 8 de maio de 2007

páginas que me impressionaram

O ritmo narrativo de Truman Capote, a construção do suspense em Patricia Highsmith, a poesia macha de David-Mourão Ferreira, refresco quando muito poeta se lê e tão insonsos; os novos verbos de Mia Couto, a escrita delicada de António Lobo Antunes, quase qualquer poema de Sophia. E mais, mas sou preguiçoso. As páginas fotográficas no 'Albas', Dinis Machado a contar dos camones no Bairro Alto e da trolha que se armou, Cardoso Pires e Baptista Bastos a visitarem Lisboa e eu invejoso de também assim a olhar mas não saber escrevê-lo tão bem. O primeiro livro de contos de Suleiman Cassamo e 'o jogo de Gerard' de Stephen King. 'O Adversário', Emmanuel Carrère, pelo assombro e o porquê presente da primeira à última página. Afinal são muitos, se continuo a passear pelas lombadas vejo ainda mais. Kerouac, o primeiro, claro. Tolkien, como devorei os três calhamaços sem conseguir parar...
Chega: é claramente post só para deixar registo, nada mais a contar. E nem digo que 'leiam, vou ler' pois não é isso que vou fazer: vou sim ler mas é na net e provavelmente muito do que lerei foi por mim escrito: ando com uma febre 'Honorato & Fidelina' e nos últimos dias ao folhetim tenho escrito sem parar, jorro atabalhoado está claro, o melhor mas que obriga a duas releituras para lhe apanhar o fio à meada, tais os atropelos. ´té já, vou até lá para ver como andam as coisas entre aquele par-de-jarras, se já morreu mais alguém ;-)

( Aqui, e espalhado aleatoriamente em diversas colecções de 'mensagens': se as 'abertas' por "webenigma" são minhas e as mais recentes tratarão do tema, há outras por outros abertas onde me alarguei a contar das tristezas e corneaduras, assassinatos e canibalismo, can-can por uma ex-sindicalista e o mais que para lá há. Visita quem quer, para 'escrever' é que é só com ficha preenchida e cartão de sócio na mão, coisa que, por avisada prescrição, não deixa dizer que sim a todos os toc-toc.)

domingo, 6 de maio de 2007

livros que não esqueço

A Verdade em 1ª Mão - Joyce Cary

sábado, 5 de maio de 2007

placa profissional 3

Lecter & Associados
comércio de carnes verdes

quinta-feira, 3 de maio de 2007

existem vários tipos de desgraçados

Há inúmeros tipos de desgraçados
e é por eles que morro
Existem os que abandonam nas ruas o cachorro
Ah, mas existem piores,
aqueles que recolhem e maltratam
Existem os que abandonam e outros que matam.

Há inúmeros tipos de desgraçados
sob qualquer conceito
Existem os que atiram sem pena no meu peito
Ah, mas existem ainda bem piores,
que matam à míngua
Existem desgraçados que matam com a língua.

Atordoado e confuso
assentei-me sobre o banco da praça
Pensando sobre quão forte era a minha dor
e enorme a minha desgraça
Acariciei o fio da lâmina
certo que sentiria dor quando rasgasse os pulsos
E ali parado permaneci
até que passassem de morte para vida
os meus impulsos

Carlos Bê

direitos de autor

Olha a novidade!... Bem-vindos ao 'mundo real', escribas moçambicanos... e gastou-se em ''duas horas", hein? cala-te boca, cala-te boca que eu até tenho vergonha em falar... :-(

quarta-feira, 2 de maio de 2007

já chegamos à Madeira?

Aqui (jornal Público), à esquerda, coluna "Portugal", e ao fundo da página 13.
O brilhante responsável pelo marketing autárquico local devia... que tal ir plantar tomate, fazer vindimas ou dar serventia, coisinhas assim mais a seu jeito?
(com redireccionamento para este blogue que reproduz a notícia. e entretanto o "prémio" foi - bem! - cancelado... haja uma réstea de lucidez em tanta insensatez)

Ri de quê?

O mundo parece estar virado ao contrário, esquisito, e o Entroncamento dos fenómenos esticou-se para cantos que eram impensáveis.
Hoje contaram-me que o Presidente já riu mais este ano que o Cavaco em dez anos. Também me contaram de que se suspeita em que a moda que se segue será a das autarquias abrirem falência técnica, e as 'Autárquicas' transformarem-se numa "Liga dos Campeões" onde os partidos mais poderosos escolhem a dedo quais as câmaras onde mais devem investir para ganhá-las, i.e. que défices escolhem nesse leilão de falidos, quais clubes de futebol há meia dúzia de anos atrás em que se tornarão as eleições autárquicas, à espera de mecenas que inventem orçamentos providenciais. Vi na TV, literalmente de fugida, o presidente do partido tradicionalmente alternante nos nossos mandos & desmandos dizer que há-de 'pronunciar-se' um dia destes sobre um valente rombo que recebeu no seu casco, com cara de aflito tantos são os torpedos e há tanto tempo que leva com eles, que quem o vê e assim se apieda estranha como não minguou mais e, glu-glu, naufragou. Mas diz que 'agora não fala', acredita-se que um dia destes o fará se não fugir ou for por água abaixo, apeado, tal como aconteceu ao chefe-de-sala do barquito do lado direito que mal se descuidou tinha o retrato desencaixotado à porta da galeria. Depois, sabe-se que o habilidoso que chefia a revolução estatal, Sócrates, poderá ser mais habilidoso que se sabia e ele contava, artes secretas em trepar escadas e muros, sebes sociais e outras esquisitices que vigoram no estratificar contínuo da sociedade e onde ele trepou, ó se trepou. Ele, o do ar evangélico, o tomado pela inspiração e graça fanáticas para moralizar e reestruturar, simplificar e moralizar, embirrou para aí e, afinal, quase que já se sabe da certeza em como ele será mais um filho legítimo da nação.
E o Presidente ri-se, contaram-me, o cuidado de me dizerem das boas cores e do sorriso rasgado, tudo feitos inéditos aos tempos do outro senhor. Ri-se, o Cavaco, contou-me quem reparou. Ri de quê? de prazer onanista por finalmente ter a maior batuta na administração da massa falida? ou será riso de nervoso-miudinho, contas e mais contas e mais contas, contas presidencialistas?

doping

Olá Inês. Digo no post anterior que vou revelar "trechos" dos calores. Água fria... que do íntimo há sabores que só se lêm no brilho dos olhos na mão-dada do cinema, esse mundo de novelas sempre por reescrever, do teu deslizar pelas palavras que, sabes, é olhar que me enlouquece. Que não conto a ninguém ou quero que alguém me veja de olhos no reflexo dum espelho que é opaco, e lá guarda o quanto te desejo à boa e clássica (arrepiante... sente-lo, a tremura da pele...) maneira. Disso não se conta nem se sussurra, não se viola o hímen da correspondência entre a musa e o seu adorador. Não falo nem conto do rubor de te imaginar - qual 'imaginar'! sentir! - olhando uma pausa no rush e sorrindo no recordar que é Musa e há hinos e cornetas quando passa e fica o 'poeta' a suar fininho, que há momentos em que é deliciosamente bom ser-se especial, mesmo que a sorte tenha sido modesta na atribuição do seu vate. O manto de folhas escritas que te incensam e despem, poemam, continuará secreto, e de tais beijos e floreados não há rima que fuja ao sítio onde os deixei: o teu peito, aí atrás dos teus seios, Inês, Inês-retrato vivo de escultura que se ainda não foi feita já a deveria estar e há muito, ou há artistas cegos como soe dizer-se ou és a alienígena perfeita que aterra na vidinha da folha seca, vazia, branca e em branco, tsunami, arquitecta e modelo de castelos, erecções e outras ondas que varrem as folhas áridas, este rubor que dá cor às letras e encaminha os dedos para as teclas menos utilizadas antes deste escalar que é contar-lhe (-te) a festa, baile e orgia que são os dedos a escreverem da paixão do escritor pela sua obsessão e cântaro de tudo, a Musa.
Fim da conversa pública, Inês: vou escrever-te um e-mail, também com o selo beijado na carícia de seres, para meu completo desvario felizmente tu, perturbante Inês, 'a' seres.

musas

Eu tenho uma Musa, de seu nome Inês. Linda, perfeita no pedestral. Inacessível. Bela. Fatal. Bem, fatal fatal não é pois é ficcionada, seu único defeito.
"Escrevo-lhe" de vez em quando. Cartas eróticas, obviamente. Obviamente? sim, claro, musa nos cinquenta's do escritor sujeita-se a cartas de Gomorra, selo lambido e tudo. Delas aqui deixarei trechos, em gota-a-gota confidente.