quinta-feira, 26 de setembro de 2013

a mão do irresoluto

nem sempre um poema diz aquilo que a gente sente.
por vezes hesita, e às vezes até mente.
mas mesmo quando mente, sente-se aquilo que nos hesita
e por isso… ele tropeça e soluça, mente.

é a poesia e não o hesitante agrafo
que diz, diz, e poeticamente vos mente.


(originalmente e em versão tosca, aqui. )

...e domingo vota-se.

terça-feira, 24 de setembro de 2013

lidos

Uma semana no aeroporto - Alain de Botton
O corpo e o sangue do Inquisidor - Valerio Evangelisti
Poemas - Reinaldo Ferreira
Lourenço Marques, Francisco José Viegas
O segredo de Copérnico - Jean-Pierre Luminet
A pianista - Elfried Jelinek (em curso)

O que tenho para te dar? Uma gramática de sentimentos,
verbos sem o complemento de uma vida, os substantivos
mais pobres de um vocabulário íntimo — o amor, o desejo,
a ausência. Que frase construiremos com tão pouco? A
que léxico da paciência iremos roubar o que nos falta?
Então, ofereço-te uma outra casa. As paredes têm a
consistência do verso; o tecto, o peso de uma estrofe.
Abro-te as suas portas; e o sol entra pela janela de
uma sílaba, com o seu logo vocálico, como se uma
palavra pudesse aquecer o frio que te envolve.
E pergunto-te: que outras palavras queres? A música
sonora de um ócio? O espesso manto com que o veludo
se escreve? O fundo luminoso do azul? Poderia dar-te
todas as palavras na caixa do poema; ou emprestar-te
o canto efémero em que se escondem do mundo.
Mas não é isso que me pedes. E a vida que pulsa
por entre advérbios e adjectivos esfuma-se depressa,
quando procuramos seguir a linha do verso, O que fica?,
perguntas-me. Um encontro no canto da memória. Risos,
lágrimas, o terno murmúrio da noite. Nada, e tudo.

Nuno Júdice
"O estado dos campos" (D. Quixote, 2003)

domingo, 15 de setembro de 2013

lidos



Vinte e tal novas formulações e uma elegia carnívora - Luís Carlos Patraquim
Duas luas entrededos - António Cabrita
No meu peito não cabem pássaros - Nuno Camarneiro
O Outro Homem e outras histórias - Bernhard Schlink
Arquivos secretos - Alain Decaux
Destroços- James Bradley
Os cavalheiros do 16 de Julho - Ken Follett/René Louis Maurice
Nós queríamos matar Hitler - Philip von Boeselaeger
1939 Contagem decrescente para a guerra - Richard Overy
A minha juventude - Winston S. Churchill
A minha viagem por África - Winston S. Churchill
Roberto Bolaño: últimas entrevistas

em tempo:

O poder angolano em Portugal - Celso Filipe
Union Atlantic - Adam Haslett
A ilha de Moçambique pela voz dos poetas - org. de Nelson Saúte e António Sopa
O escravismo colonial em Moçambique - José Capela
A livraria - Penelope Fitzgerald (em curso)
uma pernita aqui ...

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

convicções necessárias

dizer que foram uns tempos míticos, uma banda mítica, um festival mítico, soa a pouco (e passo o cliché). e estou parado de dedo no ar a pensar se nós é que fomos míticos...

ainda bem que mantenho a capacidade de me interrogar. de me duvidar. mas "hoje" iria lá. à boleia, de preferência. precisamos de nos acreditar a nós próprios de vez em quando, para reforçar a argila que sustém o 'erectus'
 

Bernhard Schlink



sete histórias de que já li quatro, e avanço que é um livro extraordinário. a cada em que me embrenho situo-me, analiso-me, striptease de que saio tanto chocado como sorridente ou preocupado. quando um livro nos estripa assim é um bom livro. nem que doa.

do autor já lera o "O Leitor" (dele também há filme), e neste confirmo a mestria da arte de contar e a pujança imaginativa, aquela que sabe como tocar cá dentro e fazer-nos saltar para o colo das páginas. não é fácil contar uma boa história, a ponto de leitor e personagem se confundirem, raio de espelho que impiedosamente nos fotografa a minúcias que julgávamos ocultas... e insolúveis.

dele, Bernhard Schlink, ali a sorrirem-me estão também "Amores em fuga", "O regresso", e "O fim de semana". um bom autor lê-se de fio a pavio sempre que possível. eu tento-o, nem que pelo caminho dê por mim apto a ingressar nos Cuidados Intensivos...

Luna Park

como é que se escreve um sorriso traquina?

muito mais que uma lista

este 'ler muito', ultimamente assumido como obsessão narcótica, autismo, refúgio, teve felizmente períodos bem mais calmos, mas, olhando para trás, dura desde sempre. desde miúdo.

pensava assim, há pouco, num passatempo que me é querido: sentado à secretária e a correr os olhos pelas estantes, visitando as lombadas, lembrando-me das memórias que tenho associadas a tantos. alguns, nada recentes, dos tais que adquirimos numa idade em que necessitamos de dar existência corpórea a passados perdidos mesmo que não os voltemos a abrir, foram-me de facto importantes. tanto, que décadas e décadas depois, várias vidas vividas, há conforto em sabê-los ali, acariciá-los com a memória. grata. nos mais recentes, de vez em quando, muito de vez em quanto, lá vem um que salta e se destaca. a garimpagem é assim mesmo, e talvez por isso persista e os devore como faço

mentalmente fiz uma lista, tipo 'os mais marcantes', depois catei-os em pilha e trouxe-os cá para cima. e agora para aqui. é uma lista pessoalíssima e o único critério é o enunciado: livros que nunca esqueci, e foi-meiimportante tê-los lido em alturas concretas da minha vida. uns formativos, outros janela, outros a bofetada ou o carinho que precisava naquela altura. nela, lista, talvez só metade figure neste tipo de listas «os mais isto e aquilo», «os que mais me», etc. mas para mim sim, eu sei porque é que cada um me foi importante. ei-la, sem outra ordem que o acaso da pilha:

A metamorfose - Franz Kafka
Escuta, Zé Ninguém - Wilhelm Reich
A verdade em 1ª mão - Joyce Cary
A cozinheira e o devorador de homens - André Glucksmann
O senhor dos anéis - J. R. R. Tolkien
O conde de Monte-Cristo - Alexandre Dumas
O adversário - Emmanuel Carrère
O principezinho - Antoine de Saint-Exupéry
Tocados pelo fogo - Kay Redfield Jamison
A louca da casa - Rosa Montero
Cem anos de solidão - Gabriel Garcia Marquez
Bartleby & Companhia - Enrique Vila-Matas
Pela estrada fora - Jack Kerouac
O fantasma de Harlot - Norman Mailer
O que diz Molero - Diniz Machado
Crime e castigo - Fiodor Dostoiévski

este blogue reiniciou. porque o ódio bebe-se até ao fim do copo, não do blogue