segunda-feira, 21 de outubro de 2013

filha da puta



 
a minha relação com os jogos de fortuna e azar é de esforço e de fé. esta, porque acredito. sim, um dia será. e por isso todas as semanas faço a aposta semanal, uma única em cada um dos jogos. uma única: é preciso é estar presente. o esforço: mesmo parcos, já houve vezes em que os euros despendidos na véspera fizeram falta. acontece. como um dia acontecerá que tudo isto será passado: virá.
 
os prémios são modestos, e mesmo numa ração controlada são mais as semanas onde não pagam a despesa que o inverso. afinal é esta a situação normal, e também por isso as apostas se reduzem ao mínimo: até ao “tal dia” – e só sairá numa única aposta, indiferente ao tamanho do leque de papelinhos na mão – a coluna do prejuízo será sempre a maior. era estúpido agravá-lo.
ontem à noite foi um momento de excepção, já a cama chamava quando numa última vista de olhos pela página online do jornal vejo que a extracção do Joker já tinha resultados. a tendência no Joker é olhar só para o nº da terminação, pois se ele não coincidir então nem que os outros seis façam o pleno de nada valerá: o prémio mais baixo premeia os dois últimos números certos, e, sem isso, haja o que haja, é só fogo-fátuo. ora não só tinha o último certo como os dois seus anteriores: 50 euritos garantidos – e se vinham com sabor que nem ginjas… curioso, verifiquei mais: dos quatro nºs restantes ainda acertara dois, e sem o ‘falho’ de intervalo – após os três certos - não eram cinquenta mas sim cinquenta mil os sorrisos garantidos (para a taluda, o ‘jackpot’, faltava também o primeiro da série). enfim, não há que ser invejoso nem glutão, e foi confortado que adormeci.
 
as apostas semanais calhou que também acabaram este fim-de-semana, assim esta manhã fui renovar a fé por outra semanita e, já agora (aqui em itálico, para se perceber melhor), “como quem não quer a coisa” receber os 50. e o que mais houvesse. não sou cliente fiel a um único agente, mas há um que privilegio dado ser uma volta que gosto de dar a pé. e lá fui. a casa estava quase vazia, e a máquina de leitura arreliada: ao primeiro boletim encravou. conversa para cá conversa para lá, aproveitei e lembrei que desejava uma nova série de esperanças para a semana, e enquanto a máquina fazia ‘Reset’ abeirei-me duma pilha de livros de bolso - nunca se sabe o que se encontra sob capas modestas. não: o que havia e podia ser de interesse eu já tinha, nem que noutras edições. mas já catei nestas, baratuchas, momentos de prazer e de riqueza às minhas estantes.
e nesse entretém a máquina reinicia-se e quem de direito reinicia a introdução dos boletins. eu sabia que “o” premiado era o segundo do monte, quando entrara e os tirara do bolso vira isso. falta aqui dizer que como os prémios são espécime rara e fraquita usualmente acumulo algumas semanas de apostas, até juntar tudo-muitos e duma única vez dá-los à conferência. já aconteceram felizes surpresas: sem a menor ideia ou lembrança dalguns prémios mínimos, a sua então descoberta e respectivo cúmulo não só permitem a renovação semanal sem ter de meter a mão no bolso, como, até, fazê-lo mas para meter em vez em tirar. tlim-tlim. os tais fogachos que alimentam a fé do “Um dia…”
 
pelo rabo do olho ainda vi o valor ’50,00’ no visor, antes da máquina avariar novamente, clic-clic, nervosamente um botão premido e o ecrã some-se, e quem de direito e com meia praga nos lábios abre-a e retira o boletim renitente, abre-a e fecha-a, e mete outro boletim à conferência. aquele, o do lampejo fugaz, foi pousado no balcão e levou um rápido risco transversal, inidentificado e inexplicado, a conferência seguiu-se sem comentários e os sem prémio – agora com essa indicação certificada pela máquina e bem visível - juntando-se em montito sobre o… sim, o premiado-riscado. lixo? espera aí, que começa a parecer-me que alguma coisa não está certa na sequência… calha que o último sujeito ao crivo também tem prémio: 2,80. um dos tais que não recordava, a surpresa, e o comentário contente: «olha olha… foi em quê? Totobola?» mal o dissera percebi o erro, e, também, logo, ela: «…no Totoloto. São 2,80. Quer receber, ou…». o ecrã dizia, (aqui itálico; itálico fodido) 2,80. oh oh…
silêncio e olhos nos olhos. uns segundos de silêncio que eu quebro: «mas… e não está aí um com 50?...», e rápido o ‘riscado’ regressa à máquina e o ecrã acende-se, soma, diz-me que o mundo afinal está certo embora nele haja pessoas que estão erradas. «pois é, pois é. 50 e mais 2,80, já faço a conta», e seguem-se  clic-clics numa calculadora de bolso para subtrair o valor da tal minha aposta semanal, e «dá 46». sem sons, sem comentários, tudo inocente e inócuo, pagou-me. e estava ruborizada. filha da puta.

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

realismo depressivo


«A maioria de nós assume, de forma simples e razoável, que a sanidade produz bons resultados e que a insanidade é um problema. (...) ...pelo menos em numa circunstância de importância vital, a insanidade pruzo bons resultados e e que a sanidade é um problema. Em alturas de crise, é melhor sermos dirigidos por líderes mentalmente doentes do que por líderes mentalmente sãos. Existem vários tipos de lidernça para diferentes contextos. O "dirigente da não-crise" impõe-se em tempos vulgares, mas em tempos de crise deverá manter-se afastado da cadeira do poder.» etc, e por aí fora até ao final do livro e dos muitos exemplos dados, científicamente explicados e documentados.

extrapolo para cá:
 

procura-se maluco com sentido de Estado. urgente. contactar o eleitorado

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

a minha crónica de hoje no O Notícias de Almeirim .

serras e planícies


«A conversa começou a tomar balanço, sobre a chuva, a partida e o regresso a casa, a verdade que é livre, e a liberdade que torna as coisas verdadeiras, as transformações dos tempos. Embora não o dissesse claramente, Eberhard começou a falar do discurso desadequado aos tempos actuais que Jorg proferira. - Sem que tenham sido rebatidos, há temas, problemas, teses, que um dia simplesmente se extinguiram. Soam a falso; quem os defende, isola-se, quem os defende com paixão, torna-se ridículo. Quando eu comecei a estudar, a única coisa que importava era o existencialismo; no final dos meus estudos, todos estavam entusiasmados com a filosofia analítica, e há vinte anos, regressaram o Kant e o Hegel. Nem os problemas do existencialismo estavam solucionados, nem os da filosofia analítica. Toda a gente estava simplesmente farta.»

in "O Fim de Semana", Bernhard Schlink, ASA. pág. 173

para dar um visual gráfico (aspas) ao excerto pensei inicialmente em certos resultados eleitorais partidários. abandonei a ideia. estava a ser mauzinho, e a esticar demais a analogia. depois pensei na silhueta da serra comum da abstenção e dos votos nulos e brancos, mas também não gostei dessa paisagem. ultimamente não vou muito com serras, cativa-me mais a planície e a certeza. então arregacei mangas ao Google Imagens e deixei-me ir. deu isto. vassourar as teias de aranha ideológicas não é má ideia. torna tudo mais claro - até provavelmente o futuro.

 

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

lidos

Bola com feitiço, Uanhenga Xitu
Movimento perpétuo, Fiama Hasse Pais Brandão
Cuma Cathu Natisunge II (adivinhas, provérbios e contos dos Nyungwes)
Cuma Cathu Natisunge V (adivinhas, provérbios e contos dos Nyungwes)
Contos africanos, Lourenço do Rosário
O conto moçambicano da oralidade à escrita, Lourenço do Rosário
Passagem para Lisboa, Ronald Weber
A casa dos budas ditosos, João Ubaldo Ribeiro
O fim de semana, Bernhard Schlink (em curso)