sexta-feira, 31 de outubro de 2008

o Outro




Os Grupos MSN são um macrocosmos na Internet. Infelizmente estão condenados e a red line está já agendada para Fevereiro que vem. Entretanto a Microsoft tira com uma mão mas dá com outra (ainda se há-de perceber melhor, pra já deixa tar) e ofereceu a possibilidade dos Grupos existentes migrarem para o Multiply, arquivos incluídos. Ora os Grupos, seja na velha versão ou na nova são um ninho de debate infindável, seja sobre a vida sexual dos pinguins ou o velho, recorrente e actualmente bem justo e pertinente, "cascar" nos maus políticos e nas más políticas suas filhas disto e por isso.

Este serão e à volta dum comentário com um amigo - a que aqui omito o nome, é irrelevante - que compara a situação de crise política actual com a vivida no pós derrube da monarquia, aproveitando para desancar forte na forma como a Democracia vem sendo praticada e alvitrando que eticamente não se ganhou nada comparativamente com o "antes 25A" não perdi a deixa e fiz "lençol". Centrei-o no nosso olhar desconfiado às diferenças que nos singularizam, no fundo "o medo do Outro" - aproveitando e deixando pequenas impressões duma conferência a que assisti esta semana.

Aqui fica com pequenos ajustes em relação ao original, feito de jorro, para quem tiver paciência de ler.

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"P....., amigo: mal e porcamente mas conheço a nossa História. Daí que tenha lido do porquê do Povo (mais o resto, mas fico-me por este lato e esqueço o restrito 'esclarecido') ter endeusado quem apareceu como capaz de pôr ordem na arena do circo. Daí que nem tu nem eu nem ninguém vem tentar provar nada. Há momentos históricos com características específicas e, à época, quase toda a Europa assentava em "homens providenciais" - de Leste a Oeste: era fórmula. Sobre Stalin: foi um cão se comparado com os nossos tribunos de pacotilha: não vejo réstias de similitude em nada. Mesmo após a WWII "continuou" internamente o trabalho de Hitler, Himmler e SS-capangas. Não chacinou exclusivamente inimigos políticos, ou pretensos, ou potenciais inimigos políticos que fossem ou ele sonhasse serem ameaças à sua égide imperial: chacinou etnicamente e se não tinha Birkenau-Auschswitz tinha a Sibéria e as valas comuns que sinalizavam a longa estrada até lá. Nem sequer teve pejo em começar pelos seus que tinham sido feitos prisioneiros de guerra pelos alemães. E para não perder a embalagem dos derrotados, à sua conta há milhares de judeus assassinados apenas por serem-no. Sobre isso nem vale a pena comparar: a História é farta em depoimentos e estudos.

Agora vamos à chicha: em 34 anos duas dezenas de governos. Se não fosse a merda em que estamos atolados eu retrucava: «porreiro, pá! a democracia afinal funciona». É que nem somos recordistas: a Itália, que sem ou com Camorra e sem ou com dois OE paralelos, o dos Governos-de-seis-meses mais o das Famílias (sim, representam um valor não quantificado mas não há possibilidade de ignorar que a economia italiana assenta também nesse pilar e ele está estucado para durar - vidé books "Gomorra" ou "McMáfia", recentes), a Itália, dizia, mesmo que volta não volta haja ex-presidentes ou ex-PM's que vão de férias ab eternum para a Tunísia e até passe por fases espúrias como a da "república dos juízes", a Itália É uma democracia. Berlusconni é perseguido pela justiça mas já foi eleito três vezes em escolha popular. Mas não é eterno. Aldo Moro foi assassinado mas o centralão sobreviveu (terá sido por isso?). E as BV's foi um ar que se lhes deu. Cá, no nosso tasco, as FP25 eram brincadeira de crianças ao lado daquelas. A Democracia tem custos. Incluindo a de vez em quando elegermos palhaços - reler parágrafo pf.

Deixemos os spaghettis e vamos às nossas broas de milho. Recentemente houve eleições numa região autónoma. Como sempre todos à sua estridente maneira urraram por grandes ou pequenas vitórias. Nem um entre todos pode porém dizer sem corar que vai assentar cu em razão de escolha popular. Não sei se no dia havia Sol e foi tudo para as praias (tou farto d'ouvir essa cá pelo "Côtinente") mas sei que não aldrabaram os números e a Democracia funcionou: a Maioria ganhou e os misters e madames eleitos não são detentores dum mandato eticamente legítimo: ganhou "a praia", ou o enjoo. Depois há as birras d'egos - não gosto de lhes chamar birras por tachos pois quando se trata de pôr a mesa tenho o mau pressentimento que a festa de inauguração da ponte Vasco da Gama era de norte a sul do País (uso maiúscula, gosto). Feijoadas à borla, seja em banco de pau ou no Gambrinus e faz-se bicha de prato estendido e «chega pra lá q'eu cheguei primeiro». Nada de novo na costa ocidental por esse lado, portanto.

200 capitães deitaram abaixo um regime militarizado, semi-militarizado, policiado à paisana ou fardado. Coisa assim tão díspar alguma razão haverá para ter acontecido com a facilidade que foi. O coitado do Newton ainda descobriu a pólvora quando a maçã lhe caiu de madura na moleirinha. Cá caiu de podre e Newtons de bancada que somos por vocação, genes, ou prazer tertuleano, como ela quando veio vinha a deitar aguadilha malcheirosa ainda não nos conseguimos livrar do mau cheiro, sendo que haja quem nem a roupa tenha (já) mandado à lavandaria embora a História já tenha desistido de no-lo implorar por causa do retrato de geração que se está a construir: ainda se acredita que a maçã não caiu por razões naturais e devia continuar, perene, nos galhos que formam a copa onde todos nos abrigamos - e que se lixassem as moscas varejeiras que nos rondavam e conspurcavam com tal íman pestilento sobre os nossos cocorutos. O pomar era tão bom tão bom, que foi um ar que se lhe deu, e o rancho que tratou da desinfestação foram duas centenas. À época, aqui pelo Ribatejo, na minha Hell-meirim, quinta de grande dimensão para as vindimas 'importava' barrôas em maior número para fazer o serviço: é que a fruta na sua época de colheita está madura mas firme. Fora de prazo, cai por si em meia chuvada ou um sopro de vento mais assobiado bastam para.... «temos Newtons cá no sítio». Singularidades lusas.


Deixei um espaço em branco para separar pensamentos pois do Passado, maçãs podres e vindimas a 200 bem feitas estou conversado, se me permites o arrojo de paragrafá-los a eito. Há sempre um Futuro. Mesmo os de amanhã terão o seu momento em que terão de pensar nele. O sistema político nacional, democrático, não está caduco. E não aguarda por Dons Sebastiões para se regenerar. Eu que não sou crente além de em deusas, musas e bacantes, digo: Felizmente! As maçãs podres no cesto é que dão mau cheiro, não é o cesto em si. Quando os senhores parlamentares perceberem que só se representam a si mais os das suas tribos porque o resto da malta "está na praia", quando a mesa da feijoada for posta e os bancos de pau estiverem mais vazios que cheios, aí, uma solução terá de aparecer. A regeneração do sistema, a vindima feira a horas, o não olhar para as maçãs verdes de varejeiras e acreditar que são mágicas e eternas e, se caindo, seremos Newtons e não uns porcalhotos que é o que seremos.

Aceito na boa as críticas à situação de crise de ética política que padecemos. Mais abrangente até, da nossa sociedade no seu global. Vivemos já há umas duas décadas bem medidas olhando exclusivamente para os nossos umbigos e olhando com desconfiança o do vizinho, ignorando-o até se ele mostrar sinais de carecer dum gesto nosso, seja para coçá-lo se estiver em conflito de comichões quer - e importante, esta - duma carícia amiga. O individualismo campeia. De braço dado com o medo do Outro.

Vou contar-te uma coisa, já agora. Esta semana tive de ir à lísbia tratar da vidinha. Como me desenrasquei melhor que esperava, vivo em Hell-meirim onde já nem nas vindimas não se passa nada e a gasolina ainda não desceu o suficiente para trolarós, aproveitei as vistas e fiz-me de urso procurando um colírio daqueles que cá não há. Não, não fui ao "Passarelle": "gajas boas" há em todos os pomares. Isto vem por causa da referência ao Outro, e à rejeição social que campeia relativamente a quem, seja por excentricidade, etnia ou hábitos culturais, seja "diferente". Fui à Gulbenkian assistir à sessão de encerramento (dois dias, calhou-me o segundo) da conferência de seu nome "Podemos viver sem o Outro? as possibilidades e os limites da interculturalidade".

Coisa assim pró complicado, auscultadores e tudo e as duas primeiras filas recheadas de muy nobres e distintas cabeças mediáticas, um smell dos tais que estive sempre desconfiado a olhar para cima não fosse cair-me na cabeleira maçã das tais com bicho. Felizmente as duas conferencistas que nesse final de tarde predicavam falavam atinadamente - diz o urso, eu, que da tradução lá ia rabiscando uma coisa ou outra pois aquilo era fruta demais para ser digerida no momento. E vem a propósito de quê? do Outro, de diálogo multicultural - que extrapolado para o nosso rectangulozito pode ser espartilhado em diálogo entre nós-os-próprios, cada um o Outro.

Recordo uma frase, e até a rabisquei. Duma académica franco-argelina. Mais ou menos assim: «na guerra do Iraque foram gastos até agora dez mil milhões de dólares. e ela iniciou-se teoricamente com o 11/9. dez por cento desse valor investidos no diálogo com o Outro, no cultivarmos a relação com o Outro e na procura de pontes de diálogo, e 11/9 provavelmente não tinha acontecido». Retórica demagógica? Talvez. Mas ficou cá a bailar. Mais a mais quando este Verão Quente em Negação do Outro ainda não arrefeceu. Foi um festim. Na nossa modéstia de brandos costumes e por escassez de meios fizemos dos jornais, telejornais e parafernálias quejandas os nossos Birkenaus e Sibérias privadas a tudo que fosse o Outro. Mas não batas já. Deixa-me terminar. Eu ouvia e a brochura sobre os joelhos com o título da conferência a gritar-me: achava que havia uma pergunta por fazer - e que nem vi feita e não a fiz que, repito, eu era o urso da sala e ainda por cima sempre desconfiado a olhar o tecto: «e o Outro pode viver sem nós?»

No final a síntese da conferência foi feita pelo nosso ex-presidente Jorge Sampaio, como Alto Representante das Nações Unidas para a Aliança das Civilizações . Depois dos rodriguinhos e das muitas e mui cultas citações entrou na chicha. Como não lhe cravou o dente nem mostrava intenção disso, eu que até sou um gajo paciente assim também não: vim cá fora fumar um cigarro ao pé dos motoristas que aguardavam Vexas, olhei as árvores e sorri, esperei que uma amiga que lá vira saísse e fomos aviar uma botelha de tinto e o conveniente lastro na tasca mais próxima - com zona de Fumadores. O Outro. Pois.

P......, abusei de ti. Confesso-o. Serviste-me de pretexto para desenrolar um lençol. Que tal desenrolarmo-lo todos? Assim a tal Interculturalidade com o Outro dava um passo em frente. Pequenito, que nós somos todos pequenitos. Tanto que o somos que, lá nas Ilhas, os Senhores julgam-se eleitos & representantes dos que à sua ementa preferem a praia. Eu fiz a minha parte: companhia amiga, rolo de carne à francesa e uma botelha de tinto. Não sei nem me interessa onde o Sr. Sampaio jantou e o que comeu, até se houve maçã à sobremesa. A sua síntese (até onde a ouvi) ia falha do Outro. Afinal o cerne, o mote, a chicha para sintetizar e não para tornear.

Grande abraço. "


(imagens daqui e daqui. gracias, incluindo as institucionais)

2 comentários:

Anónimo disse...

De passagem e em dia de aniversário de que também és culpado, pergunto: quem era para mim o web se não fossem os netgrupos? - porra, nem quero pensar nisso!...
beijo,
muf' & chuinga

Carlos Gil disse...

mufanita!!!! uma caneca a espumar de beijos para ti!

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