sexta-feira, 20 de abril de 2007

O ruído do aparo; eu e Sócrates, covilhanenses mas parolos; o luxo de ter Sol em Abril como nem os finlandeses nem os chineses têm

Arrasto a caneta em patéticas construções como o rabo preguiçoso arrasta a cadeira, rangidos que incomodam quem tem a delicadeza de ser sem incomodar. Cansa-me escrever muito e gostava de ser poeta porque estes escrevem pouco e muito, precisam de escrever pouco para terem 'muito' escrito. Eu não: zaca-zaca, viro folhas a cuspo de tanto nelas me esconder, chinelo de medida trinta e oito que sonha jogar na NBA e sabe-o assim difícil curto como é, zaca-zaca toca a abastardar a pegada. Vou votar no José Sócrates (seja para que freguesia for e esteja ele em que associação estiver) se se confirmar algum do bruá da Universidade Independente: tenho simpatia por um gajo que é tão nabo e tão esperto que chega a general por artes próprias mas é tão parolo que cai no risco de falsificar o diploma de sargento-ajudante, aspirante a fazer pela ´vidinha’ o melhor que conseguisse se aquilo da Política “não desse certo”.
Que tem isto a ver com Poesia, ou com o meu tamanho de chinelo? o laço é a falsificação do bilhete de identidade. Explico. Como ele sou um parolo, a provar-se que falsifiquei a vida substituindo uma caneta administrativa com alguma arte e engenho – diziam alguns…, por outra em que tais dotes foram sobrestimados, tornando o tal rabo preguiçoso. Daí os rangidos ao arrastar da cadeira que incomodam quem à poesia tem o respeito devido, até pela leitura de muita da sua invejosa, a prosa. Em arrastar para a frente descobri que não é de meu jeito encontrar a pura rima da poesia, mais chiar no erro da obsessão pela rima óbvia, ter ‘diploma’.
Fechar-se-á o círculo se, a serem as coisas assim mais que sugerido é dito, juntando Sócrates a sua cadeira à minha no canto dos poetas falhados, retribuir-me a atenção e simpaticamente comprar-me um livro, cada um na sua parolice e dizendo de sorriso parvo que o que traz no colo são rosas, lindas ideias em flores e escritas, rosas e poemas, senhores.
Tenho dificuldade em avaliar o desempenho do Governo: nota-se que se esforça mas não se vê a rima prometida e, olhando-o, vejo o meu espelho a olhar para mim, tanta boa ideia e intenção mas tanta remela em volta dos olhos, amarelos de tanta ruga olharem; lá no departamento que nos governa cada mês que passa há ministros atrás de ministros que engrossam os já não escondem a cara de desiludidos com o País que era suposto governarem rumo a futuros que, vê-se na falta de sintonia e rima, não são para ele, são-lhe mundos estranhos ao seu pé pequeno e de curto ritmo. Sócrates impinge-nos a falsificação colectiva da identidade, quer transformar este Abril que para nós já é mês de Sol num qualquer calendário ‘moderno’, daqueles da Era da Globalização que dizem que é mais importante o custo da sua edição que a beleza da foto que mostram, banais folhas que se arrancam sem saudade, apenas preocupados que haja outra nova que lhe suceda, e outra, e outra, a sobrevivência. Aterroriza-nos com os rácios de produção finlandeses em tecnologias de ponta e ao dizer aos chineses que a nossa pobreza é um ‘cluster’. Como presidente de junta com uns tostões guardados, nas festividades solta foguetório para que haja bailarico, no discurso fala em um dia se ser uma grande cidade e, no dia seguinte, aperta com os funcionários para ver quem tem a licença do ‘caniche’ em atraso e vai almoçar com os empreiteiros, sonhando a sua freguesia pejada do que não é e, suspeito tal como à minha poesia, nunca será, cidade.
Somos ambos “da Covilhã”: as aspas vêm por mim que, não lá nascido tecnicamente pois razões de precaução aconselharam os meus pais a eu nascer na maternidade Alfredo da Costa, lá vivi do ano zero ao sete, antes de pisar o tombadilho do ‘Infante D.Henrique’, paquete até aos vinte. O Alçada Batista também é da Covilhã mas ao que dele sei tem mais tias e gosta mais delas que eu ou o José Sócrates, e é melhor pessoa que nós: que se saiba, nenhuma delas é imaginária, falsificada como é a política do “engenheiro” e diz-se que o seu diploma também, e já agora o tamanho do meu pé, tropeção e arrastão sem rima, viver diário sem Sol em Abril e Poesia no resto do ano que lhes valham ou o futuro prometido antevendo-se como possível, não se sendo por bilhete de identidade finlandês ou chinês, Poeta ou Escritor: nem todos os beirões triunfam, zaca-zaca a abastardar a pegada, é nas estantes que estão os romances e os livros de História e odeiam-se as rugas do espelho.
Rimar um País com o Mundo como se não houvessem fusos horários, trópicos ou glaciares, é tão utópico ou tinta perdida como acreditar que quem escreve três mil e seiscentos caracteres é um poeta e não um industrial da rima, um prosador. Toda uma fronteira de diferença, toda a arte de em poucas letras soltar um suspiro, a elegância de se saber ser governante da sua própria freguesia e não da sede de concelho ao lado, passem os seus exotismos nórdicos ou orientais que afinal pouco valem ao pé da nossa tipicidade de ter Sol em Abril, medida trinta-e-oito mas quarenta e seis sonhado e portuguesmente bronzeado, passe agora o rangido do aparo que à falta de melhor rima havia de soar.

11 comentários:

Anónimo disse...

E de linha em linha, conseguiste que a tua prosa me fizesse ler este post inteirinho, eu que só vinha convidar-te a ler o 3º capítulo do livro do Amoz Oz, 'como ou porque me tornei escritor'- beijo, muf'.

th disse...

Só passei a dar um beijo, th

Anónimo disse...

eu não continuo a não conseguir ler tudo o que escreve,peço-lhe desculpa pela sinceridade. não sei quem o convenceu que era escritor!!?

Anónimo disse...

corrigindo; eu continuo a ...

Carlos Gil disse...

foi uma assombração cara Anónima... e eu fui na treta embora devesse ter desconfiado: é que eu tb não me consigo ler a mim próprio, "sempre". há momentos em que saltito no texto como pardalito em beiral, tem-te não caias.
porém adianto-lhe: os meus melhores 'textos' não estão em blogue, jornal ou livro: são por mail e vagueiam por onde calha. quer fazer a experiência, ler-me em pontas e sem corrector?
obrigado pelo seu sincero comentário

Anónimo disse...
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Carlos Gil disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
th disse...

Isto seria suposto ser uma caixa de comentários ao post em causa, em vez disso há críticas, aceitáveis, mas teem um senão´...são dirigidas a VOCÊS...e quem serão vcs?
aqui é que o mistério se adensa.
Eu sou amiga do Gil, e não é por ele ser homem e haver falta deles, e gosto do que ele escreve, mesmo que algumas vezes tb não entenda lá muito, mas tb não é para entender, ele escreve para extravazar o que sente e aquilo que as pessoas sentem nem senpre é para entender, é para ouvir, ler, e ponto final.
th

Anónimo disse...

Enfiou a carapuça Kusca?
O nome fica-lhe mesmo bem.