segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

devaneios da estante

1 - Há tempos uma amiga disse-me que achara um piadão à frase «Quem tem uma vagina, tem uma mina», lida ou ouvida algures. Concordei, como não? Seja em estricto sentido anatómico-naturista, ou naquele que o insígne pensador Sir Charles B. Walters designava como "as menos dolorosas realidades da vida", a afirmação está correcta, plena de argúcia e malícia (e a pimenta atiça o comer, sabe-se). Porém ficou cá a bailar-me...
2 - Gosto de Armando Silva Carvalho - mas prefiro-o como prosador a poeta. Creio que o 'descobri' no estupendo "O Livro do Meio", escrito "a meias" com essa senhora do aparo, Maria Velho da Costa, e a partir daí segui sempre à sua procura conforme me era possível. Antologias, livros antigos, referências na imprensa, e certa vez que por razões de ganha-pão tive de ir a Óbidos, terra linda e merecedora doutras visitas menos engravatadas, no caminho recordei-me que A. S. C. era natural e residia numa aldeia (vila?) que ficava em caminho, não hesitei em torcer a direcção aos honorários e ao dia, e ficcionei durante duas voltas ao 'centro' que me cruzava com ele e o reconheceria, por lá almocei vigiando os vizinhos, tentando descobrir-lhes sinais-de-escritor. Dele, o ele que impus à realidade naquele momento. Entretive-me e almocei bem, amenizei o débito profissional.
Isto porque há pouco peguei no seu calhamaço "O Que Foi Passado a Limpo - Obra Poética" (Assírio & Alvim, 2006), e dei com o poema que transcrevo, onde, embora enviesada, surge a referência à vagina-mina como musa (olha a novidade, resmunga-se!), em poema incluído no seu "Alexandre Bissexto", datado de... 1983.
Encontrei o rasto do que me levara a não arquivar a frase «Quem tem uma vagina, tem uma mina»? Talvez. Porque, agora, relendo-o, recordo-me dele, sim. Cruzamentos de linhas...

"Vagina galeria duma mina"

As vestes da matriz roçaram, pelo meu cérebro
e acordei.
Existe uma simetria secreta
entre a metalurgia
e a obstetrícia.
A Terrra-Mãe mentaliza os seres
como os alquimistas geravam
a raiz do ouro.
E novos labirintos sobre labirintos
galerias de minas e de sonhos
penetram e transtornam o corpo
da grande mãe, poli-aberta.
Vesti-me de escarlate
eu quero divagar como sangue do sangue
nas grutas dos mamilos
e nas mais dóceis e doces
docas maternais
do meu umbigo.
Vagina geradora de todas as descargas
do meu pénis.
Eu sou o papa das americanas,
das filhas de família
e dos actores que roem as unhas
ao Morcego.
Vermelho mal dos pés que os faz
alados no metropolitano.
Mina que canta o metal da morte
nas embocaduras do apocalipse.
Alexandre - o Bissexto
ad majorem dei gloriam.




3 - À procura duma imagem dei com esta maçã. Não digo que é suculenta senão chamam-me pornógrafo. Sou só um rapaz de bons gostos e que adora rilhar maçãs.
Curiosamente - estas linhas cruzadas... - encima um poema de Maria Teresa Horta (hélàs! As Três Marias, lembram-se?) que também transcrevo:

É cálida flor
E trópica mansamente
De leite entreaberta às tuas
Mãos

Feltro das pétalas que por dentro
Tem o felpo das pálpebras
Da língua a lentidão

Guelra do corpo
Pulmão que não respira

Dobada em muco
Tecida em água

Flor carnívora voraz do próprio
suco
No ventre entorpecida
Nas pernas sequestrada.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Happy... 2012. E o Natal, pois

quero desejar-vos - e desejar-me - um longo Natal.
que estas luzinhas que nos brilham e nos fazem brilhar, que nos fazem acreditar-nos como melhores pessoas qu'aquelas que realmente somos, durem muito, muito, um longo ano, um longo Ano Novo, e que os nossos mais belos sentimentos, repristinados pela época e pelo seu espírito, apaguem, suplantem, façam esquecer com um sorriso aquele mauzinho que aí vem.
Natal? ultrapassa a noção de data festiva ou religiosa, é um sentimento. dê-se-lhe rédea solta, que não temos nada mais verdadeiro e puro que os sentimentos.

domingo, 18 de dezembro de 2011

o meu avô Domingos e as agências de rating

num mundo onde cada vez mais o grátis é só domínio do virtual (quase), o capataz-gestor duma gigantesca cooperativa de machambeiros de sofá arrecadou uma camioneta de notas ao sujeitar à gula dos 'investidores' a fauna e flora que outros tratam e cultivam, graciosamente e com horários esclavagistas.

eu não sei o que pensam disso as agências de rating, mas o meu avô Domingos, que era marceneiro na Borralheira e trabalhava com as mãos, não auguraria grande futuro nem ao negócio nem ao investimento.

entretanto, o sr. primeiro-ministro acabou de nos avisar em como dentro de vinte anos o valor das reformas será de metade das actuais, e aconselhou os que têm em vista tal baliza a começarem já a poupar. os políticos são sempre optimistas, quando se trata do futuro, e também um bocadinho tontos quando olham para as nossas carteiras, no presente.

no tempo do meu avô Domingos, que morreu velhinho e sem reforma, toda a aldeia tinha machambas e, se as mesas não eram ricas, as batatas e as couves eram reais. o resto era uma miséria mas as sopas eram reais e dignas dum triplo A.

daqui a 20 anos isto será tudo tão moderno, tão avançado, que as sopas serão grátis e nem precisarão de colher: olham-se com desvelo, e ficamos todos de papo cheio. eu não sei o que os historiadores do rating histórico dirão desta época de tontos, mas suponho que concordarão com o meu avô Domingos: lixo: 767 milhões de exemplos em como se cultivam futuros meios pratos vazios.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

(do Facebook:) Wilhelm Reich



Wilhelm Reich foi um dos gurus da minha adolescência. das tais 'descobertas' que nos fazem sentir como iniciados num segredo fabuloso, e por perfídia dos maléficos Poderes oculto do saber comum, do homem comum. sentimento próprio à idade, mais a mais apimentado com o envolvimento da sexualidade então emergente e que berrava por todos os poros, sequiosa não só de satisfação carnal e sentimental mas igualmente duma plataforma ideológica que a pacificasse no íntimo, fustigado com os remorsos das punitivas moralidades da educação católica.

além desse deslumbramento Reich deu-me mais e que ainda hoje reside. faz parte resiliente da minha formação e - porque não! - do meu crescimento intelectual. porém passo essa parte e centro a lateralidade do comentário numa lição, uma triste lição: um visionário encontra sempre resistência à aceitação das suas teorias e arama-se-lhe e mina-se-lhe, com todos os aguçados poderes vigentes disponíveis, o campo das suas experimentações: Reich foi perseguido por ditaduras como por democracias por ser um revolucionário, mais a mais não seguindo as fórmulas tradicionais (e os campos) de contestação: tanto a(s) ideologia como a religião, a ciência, se viam ameaçadas.

hoje sobrevive num Instituto, nas estantes, no YouTube, e na memória que me assalta quando tenho um orgasmo e sinto-me um egoísta por tanta energia ter o seu potencial reservado exclusivamente para meu prazer, e vá lá que para quem mais lhe assiste. será (também) um efeito do subconsciente, protector, a tal vontade irresistível duma sorna, after?

os sábados à tarde são lixados. vagueia-se no cosmos da psicanálise d'estante, e parte do resultado é assim: lido "amanhã" é lixo filosófico. a outra parte? onanismo, amigos. onanismo intelectual. a casa gasta muito disso

Odetta

instalou-se-me o silêncio enquanto sentia o arrepio. tão boa, esta interpretação!

(do Facebook:) Miguel Sousa Tavares e a cozinha


gosto de Miguel Sousa Tavares, e no 'like' incluo o cronista que diz o que pensa (normalmente pensa bem) sem medos de afrontamentos e sem cuidar de modas e longe dessa porcaria do 'politicamente correcto', do cidadão defensor de causas que não se fica por assinar catarticamente as petições do Avaaz ou perorar de sofá nas redes sociais, li com agrado os seus romances depois duma resistência inicial completamente presunçosa e portanto parva, admiro e invejo o aventureiro que correu lugares que eu gostava de correr, e da mesma forma que eu gostava dos correr, e agora fiquei a gostar dele como man da cozinha. explico.

eu sou cozinheiro de sofá, pois além da sopa de cebola (de pacote, claro), do esparguete com orégãos e alho e dos meus fabulosos ovos mexidos às 6 da manhã e servidos na cama (que after eggs fica ainda mais desalinhada), só arrisco em sandes, por vezes criativas, e ovos estrelados. porém leio, em devoção, as críticas gastronómicas e as receitas dos chefs que vêm na imprensa. babo-me! sonho um dia 'ser capaz', ficciono refeições-surpresa que farão brilhar de encantamento olhinhos que eu cá é que sei, e até gostava de fazer um bom curso de culinária. municiar-me. pronto: cozinheiro de sofá, está explicado.

isto porque venho do café* onde lhe li a entrevista na revista Única, suplemento do Expresso - sem link disponível, e gostei dela da primeira pergunta até à última resposta: o MST de sempre, a postura de sempre e a tal que confessei admirar. é que "a cozinha" é bem mais que elaborar para alimentar, é templo até enformador de carácteres, é atitude. das tais doses que nunca temos em conta e saldo suficientes, se nos quermos 'alindar' a nossos próprios olhos. ao nosso espelho, o tal que é irmão germano do algodão que não engana.

não me vou esticar mais. recomendo a sua leitura, por decorrência a do tal livro que MST lançou recentemente e de que trata o video anexo a esta notícia. já que lhe porão as mãos em cima (revista Única), igualmente recomendo o 'fait-divers' da reportagem sobre as heranças insólitas. giro :-)

* escrito este domingo

BWM sem 'banglices'





a BMW conseguiu livrar-se com sucesso do estigma da 'era Chris Bangle'* e deixou de nos traumatizar com jóias tecnológias vestidas com algumas das roupagens de pior mau-gosto da moderna história do automóvel**. voltamos a cruzar-nos com 'bêémes bonitos', e este Série 6 Gran Coupe rivaliza em beleza com o seu rival directo Mercedes Benz CLS, (nisso) ganha aos primos germânicos Audi A7 e Porsche Panamera, e chega a tocar o feudo do belíssimo Maserati Quattroporte no título de berlina de luxo 'mais bonita' - o Aston Martin Rapide e o Bentley Flying Spur são casos à parte, que já entram na reservadíssima categoria hiper-luxo. peguem num babete, abram o link e cliquem nas fotos, por favor :-)

* Chris Bangle foi 'Chief Designer' da BMW nos anos 90's do ido. embora tenha saído do cargo por rescisão amigável e sem uso de colete-de-forças, na versão oficial, é sintomáticamente venenoso que na nota à imprensa o CA da BMW tenha-a terminado com um curto parágrafo assassino: 'não foi emitida carta de recomendação'. hoje, "o americano maluco", como era conhecido, tem um obscuro gabinete de design em Itália, onde o imagino muito feliz a desenhar máquinas de cimbalinos parecidas com naves lunares.
** chegaram a circular na net petições pedindo quer a demissão, quer, até, o seu assassinato se ele não saísse voluntariamente. em nome da estética, da arte, da imagem e história da marca. lembro-me duma que chegou a atingir as centenas de milhar de subscritores. eu assinei uma ou duas, mas depois fartei-me e passei "só" a chamar-lhe fdp sempre que via uma das suas "criações". e tanto que elas venderam, meu Deus! como uma tecnologia moderna, fiável e perfomante, associada à imagem duma marca que garante status (e boa recompensa na hora da revenda) por si vendem, menorizando valores como a beleza...

ainda o caro Sir Charles Brenton Walters


«...e tantas vezes a Lua é minúscula, e tantas vezes é enorme. Entre uma e outra, a nossa mão; pantógrafo das emoções e redactor assistente, nas suas linhas até cabe o destino. E isso, se realmente é verdade que se prevê espiando a Lua, nunca são linhas que se escrevem: o céu e os astros são as estantes dos Deuses»

Sir Charles B. Walters, filósofo e astrónomo inglês prematuramente falecido (1855-1911)

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

(do Facebook:) Os Amigos de Alex, 2?



vejam, vejam! :-) isto deve ser o que acontece à 'velha guarda' quando se metem a encontrar as velhas amizades pelo Facebook! um "Os amigos de Alex" em versão soft core mas muito álcool, drogas e rock & roll, e bem hard eheheh
cá por mim informo que não vou aceitar pedidos de amizades de malta dos tempos da juventude, não tardava e tava nestas figurinhas! ;-)

1974, 75...

o silêncio já se instalou. já passa das horas, e elas fazem-se momentos vividos e ouvidos na memória. recordo.

a noite só quebrava quando o corpo o exigia, e então pelos vidros forrados a celofane colorido entravam as primeiras luzes, na avenida àquele instante mágico em que nada de nada se ouve (todas as noites o têm, todas) um ou outro dizia existir, soava, soavam. alguns.

nós? mergulhados no torpor do brindawn, finalmente silenciados, esvaídos os lipos e os prelos e as metas e tudo tudo, como manequins abandonados nos cantos da sala, a luz pseudo psicadélica, avermelhada, azul, verde, ainda sobrepondo-se à suave luminosidade que entra, lá de fora. lá de fora, mas ainda é cedo: nós. nós, corpos castigados, cansados, mas os olhos brilhando. de entendimento? de vida. seja de cansaço, seja, mas de vida sim. e

um (eu?) levanta-se e vai ao pickup. silêncio. silêncio falso que todos os movimentos são-no, movimentos, e todos os sabemos, todos nos entendemos. a mão tira um lp das capas, acerta a agulha e mao e olhos sentam-se, a luz mais forte, o som lá fora já presnete.

mas soa Melanie. sim, era essa a música do brindawn. o Luís gostava, eu gostava, o Ruca também. o Jonhy, o Hélder. Vasco. Afonso. Chemane. Bebé. Wilson. Joãozinho. nomes, nomes, nomes. Melanie, era Melanie a música do nosso brindawn. e a cidade era silêncio

Sir Charles Brenton Walters


«Não há pessoas que nasçam especiais. Constróiem-se. Somos vulgares. Ser-se especial (para outro; para outros) não é qualidade intrínseca, faz-se, constrói-se. Sem esse esforço - que o é, e ou se deseja tê-lo ou nada de 'especial' resulta - somos banais. Alfinetes na massa da humanidade. Com um lado suave ao tacto e outro dolorosamente acerado.»

Sir Charles Brenton Walters, filósofo inglês, 1855-1911

Sir Charles B. Walters


«Por muito que a consciência - esse barómetro metereológico do íntimo! - nos avise, a chegada da Era Glacial é um choque térmico que gela os dedos tornando-os inúteis para a sua mais nobre missão: polvilhar os dias escrevendo-os de alegrias. Os meios de comunicação reduzem-se inexoravelmente às ondas rádio que percorrem a memória, tundra onde o branco ameaça invadir recantos que foram conforto, festa, rejuvenescimento. É a vida e ela decai conforme envelhecemos, e a Humanidade tem é de se conformar: quem maculou o planeta na ânsia da felicidade de ilusões perenes foi ela, quem imaginou deuses perfeitos foi ela.»

Sir Charles B. Walters, frustrado mapeador coronário (de acérrimo perfil conservador) mas prematuro filósofo ecológico mais ou menos bem conseguido. 1855-1911. amén a ele

o fim do €uro? quem se previne....



uma autarquia previdente: Hellmeirim já se prepara para o fim do €uro!


:-))

(do Facebook:) Pornopopeia

acabo de ler no Ípsilon, o suplemento das 6ªs do diário Público, a crítica do romance "Pornopopeia" (saiu na Quetzal), do brasileiro Reinaldo Moraes (e já cusquei a edição online do Ípsilon, onde esta matéria ainda está omissa), e digo-vos que fiquei naquele frenesim de sedução que, noutros tempos, me faria correr para uma livraria e berrar «Eu quero!».

agora quero falar-vos um bocadinho da minha reputação: considero-me incluído no lote dos mais conservadores entre os 1.635 membros desta ami-comunidade com que me honram (mas não sou casto, beato ou diplomata, ó não). isto para avançar recauchutado para a declaração d'o meu interesse só ter explodido a, vá lá, uns meia-por-meia pela descrição do tema da 'conversa' que o bom do Reginaldo desenvolve: droga, sexo, álcool, tudo em desbundas loucas, naquela boa-vida que, hoje, aos cinquenta's, dizemos, frustrados e mentirosos, gostaríamos de a ter gozado nos trinta's. é que parece que o livro está maravilhosamente bem escrito. naquelas escritas em cavalgada de que poucos são mestres a ponto de não nos deixarem saltar da sela antes da última palavra. João Bonifácio, o autor da crítica, empolga-se nos encómios ao ponto de 'menorizar' Henry Miller e Charles Bukowski, os santinhos mais useiros quando se pisca o olho ao género.

penso que em mim é uma estreia, mas, este, recomendo-o sem o ter lido. oxalá não me engane - um dia lá calhará e hei-de tê-lo nas unhas ;-)

...pois eu digo, meu caro Bukowski, quem me dera que a coisa fosse mais equilibrada....