sexta-feira, 12 de agosto de 2011

a esteira ao pé das estantes

estendo as palavras e deito-me a seu lado, aconchegado. não nelas, que sou meu próprio leitor. aconchego-me ao seu calor como a um corpo que me faça dia e seu diário. dividimo-nos. o autor é um ficcionista endiabrado pela febre da criação, e o personagem em simultâneo o produto e ele próprio: outro leitor e sonhador, mas todos militantes da irracionalidade apócrifa da ficção: o livro é mais do autor qu'o desenhou, ou do leitor que o burila para encaixá-lo nos seus próprios sonhos? as lombadas têm nelas duas estórias e só quem as leu sabe de ambas. a matriz editada e a obra única, personalizada: o prazer do leitor-criador que esteira e estiva as palavras ao seu lado, aconchegando-as ao seu corpo e dando-lhes o único dos seus sonhos e do seu calor.

e gosto disto, do pegar numa ideia inicial e dar-lhe uma vida secreta. mesmo se me leio, então um eu estranho ao que foi autor. rechear o público com o privado, multiplicar as estantes em cada leitura, e quando das minhas mostro estendal deixar um canto amarrotado como se fora um código para iniciados: eu li-me (escrevi-me), sim, mas do que li construí um enredo alternativo, outra solução mágica para as agruras das personagens (eu?), e entre-folhas de carícias tão íntimas como as que todos tivemos e estão nos livros todos, há sempre um beijo que me sorri tanto que não o conto a ninguém. até ao próximo escrito? gosto de pensar numa vida suave onde todos os escritos têm contido um conto de amor, mesmo se no contado não s'o leia: há tantas vidas, tantas estantes, e como me sorri a ideia de que também há nelas tantas histórias de amor...

depois há o momento em que se faz um Reset para alinhar as lombadas e não se perder o fio à meada, acreditando na fidelidade da cópia de segurança. onde páram as memórias? que páginas e páginas as contarão? se se solta a mão para que escreva autónoma do fluxo de ideias, igualmente s'a solta para picotar todas as letras dos nossos alfabetos mais queridos, os tão livres de pontuação que nunca conseguimos dar-lhes mais que parágrafos, pausas, esses sorrisos do recordar. ela voa!... corre enlouquecida e enlouquece-nos ao lê-la, felizes por viver, escrever!

e deito-me na minha esteira, aconchegado nas palavras, nas memórias, em conseguir ler e ler-me sentindo-me autor e personagem, habitante nunca de mim clandestino nestas páginas da extensa estante que é viver sem silêncio, escrevendo-nos. e deito-me na minha esteira

(ela voa)

1 comentário:

genuine_pills disse...

on the road again? if you mean running i totally agree coz it can help with Women's Health