quarta-feira, 5 de março de 2008

o equilíbrio

para contrabalançar o post anterior, aqui vai, à época, "Le Vin" (L´Âme du Vin) de Charles Baudelaire e da sua obra maior "As Flores do Mal" (com tradução de Fernando Pinto do Amaral), Assírio & Alvim, 2ª edição de 1993:
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Nas garrafas cantou, uma noite, a alma do vinho:
«Homem, pra ti exalo, ó caro deserdado,
nesta prisão de lacre vermelho e de vidro,
Um canto cheio de luz e fraternidade!
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«Sobra a colina em fogo, sei quando é preciso
De esforço, de suor e de sol bem ardente
Pra me engendrar a vida e me criar o espírito;
Porém não quero ser ingrato ou malevolente,
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«Porque imensa alegria sinto ao ar caindo
Na goela de um homem plo trabalho
E o seu peito quente é um sepulcro suave
Que me agrada bem mais que as adegas frias.
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«Não ouves ressoar os refrãos domingueiros
E no meu peito ansioso a esperança a gorjear?
Cotovelos na mesa e manga arregaçada,
Irás glorificar-me e estarás satisfeito;
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«Da tua esposa encantada acenderei os olhos;
Devolverei a força e as cores ao teu filho
E serei pra tão frágil atleta da vida
O óleo que enrijece aos lutadores os músculos.
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«Em ti hei-de cair, vegetal ambrosia,
Precioso grão que sempre o eterno Semeador
Lança, pra que do nosso amor nasça a poesia
Que brotará pra Deus como uma rara flor!»

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