quando éramos tão putos que tudo o que fazíamos brilhava a
pontos de acreditarmos que nós próprios éramos fonte duma luz mágica e secreta,
iniciadores de algo que desvendávamos em gestos irreverentes, os mitos eram
aprendidos e alimentados com a naturalidade de quem crê na possibilidade de
todos os impossíveis, num desfazer contínuo de rótulos, atitude que em si mesma
se rotulava como outro mito e sem que isso nos ralasse: viver! viver uma vida
nova, um homem novo, uma forma diferente de viver em ruptura mas recheada de
conceitos quiçá ingénuos mas cândidos de lindos, como amizade, amor, paz,
harmonia com a natureza e todas as suas formas de existir. os hippies. a
contracultura. o Éden como possível. e assim crescemos marcados por essa
matriz, esses carimbos que nos foram apostos na idade e no tempo próprios. hoje
somos filhos de nós mesmos, produto enrugado deste processo geracional. somos
lindos.
recordo muitas vezes esse meu tempo. esse nosso tempo. reconheço os mitos mas sorrio-lhes com indulgência em causa própria mas com o respeito devido a algo que a olhos alheios é visto como meros excessos adolescentes mas, vivendo-o, testemunha de mim próprio, sei serem mais que isso. terem sido mais que corridas de quarteirão, lábia filosófica, uma bebedeira geracional. foi mais. na nossa Wikipédia íntima sabemos que esta entrada conduz a uma descrição mais densa que um rodapé na vida, é a matriz do "sermos" hoje. o privilégio de termos vivido uma época especial - e num local tão especial como foram as nossas ruas, horizontes de que a memória nunca abdica - é algo de que nos orgulhamos mesmo que não se alarde quando o Outono nos mente tentando envelhecer-nos, que nem de velinhas precisa para brilhar: os putos de hoje, os nossos filhos, quando nos ouvem olham-nos como mitos vivos bem além do culto do amor àqueles que foram os seus sábios e cajados desde que por cá andam.
recordo muitas vezes esse meu tempo. esse nosso tempo. reconheço os mitos mas sorrio-lhes com indulgência em causa própria mas com o respeito devido a algo que a olhos alheios é visto como meros excessos adolescentes mas, vivendo-o, testemunha de mim próprio, sei serem mais que isso. terem sido mais que corridas de quarteirão, lábia filosófica, uma bebedeira geracional. foi mais. na nossa Wikipédia íntima sabemos que esta entrada conduz a uma descrição mais densa que um rodapé na vida, é a matriz do "sermos" hoje. o privilégio de termos vivido uma época especial - e num local tão especial como foram as nossas ruas, horizontes de que a memória nunca abdica - é algo de que nos orgulhamos mesmo que não se alarde quando o Outono nos mente tentando envelhecer-nos, que nem de velinhas precisa para brilhar: os putos de hoje, os nossos filhos, quando nos ouvem olham-nos como mitos vivos bem além do culto do amor àqueles que foram os seus sábios e cajados desde que por cá andam.
vem-me à cabeça um dos mitos - e chamo-lhe assim porque
nunca o testei: a laranja. a laranja, dizeis, amigos? a laranja, sim. o
preventivo para se ocorresse uma bad trip. lembram-se, freaks? dizia-se que
chupando uma laranja a trip pararia, era remédio santo. tive bad trips, sim, e
talvez quando me municiava para uma trip com as pequenas coisinhas que achava
que seriam úteis na viagem, desde o celofane do maço de tabaco cheio de cabeças
já antes provadas e sabidas como 'boas', a objectos já por si interessantes mas
que se imaginava ganharem potenciais fantásticos quando o nosso estado mental
ganhasse as asas do ácido e trepasse por aí acima, tornando tudo que nos
rodeava mágico («as coisas, Charlie, as coisas…» explicava-me com um sorriso o
bom do Zeca Bife), e talvez, dizia, nalgum desses preparativos tenha juntado à
lista uma laranja, não fosse acontecer e... não sei, mas que se dizia que sim,
dizia-se.
nestes silêncios chupo a laranja da vida. toco a campainha da minha carruagem para me apear da nuvem onde, sei-o, novamente me perdi. e recordo com um sorriso em como na minha colecção de tesouros tinha uma lupa e um prisma em vidro, que sempre adicionava ao rol dos objectos que escondia na caixa da bateria da mota, quando ia para uma trip. porém não tinha uma bússola embora seja um objecto que sempre me fascinou e desejei, tanto que há poucos anos atrás, já nestes cinquentas tanto bonacheirões como rezingões, uma bússola foi a prenda mais querida que mulher e filha me deram num aniversário. e sorrio tanto, ao pensá-lo... um salto, agora: a bússola está na gaveta da mesa de cabeceira. a laranja, aqui à minha frente, sempre, constante. a bad trip vence-me mas luto, ó se luto. eu sei que viajei em nuvens, e quem disso provou não o esquece, não desiste. e chupo a laranja, embora não abdique da máxima: há algo que não mudou e desejo que nunca se modifique: o refúgio dos sonhos.
com menos imagens: muito menos: vivo uma idade complicada. eu, que já sou complicadinho da silva (sempre assim fui). abdico de cavalgar as nuvens mas é impossível esquecê-las. escondo-me no silêncio dos sonhos. mentindo-me, acreditando em tudo. em tudo, neste tudo tão total e irreal onde tudo se realiza perfeito e, magno exemplo, ninguém sofre e a felicidade campeia. freak forever. mas, precavido, com a puta da laranja no bolso. merda.
nestes silêncios chupo a laranja da vida. toco a campainha da minha carruagem para me apear da nuvem onde, sei-o, novamente me perdi. e recordo com um sorriso em como na minha colecção de tesouros tinha uma lupa e um prisma em vidro, que sempre adicionava ao rol dos objectos que escondia na caixa da bateria da mota, quando ia para uma trip. porém não tinha uma bússola embora seja um objecto que sempre me fascinou e desejei, tanto que há poucos anos atrás, já nestes cinquentas tanto bonacheirões como rezingões, uma bússola foi a prenda mais querida que mulher e filha me deram num aniversário. e sorrio tanto, ao pensá-lo... um salto, agora: a bússola está na gaveta da mesa de cabeceira. a laranja, aqui à minha frente, sempre, constante. a bad trip vence-me mas luto, ó se luto. eu sei que viajei em nuvens, e quem disso provou não o esquece, não desiste. e chupo a laranja, embora não abdique da máxima: há algo que não mudou e desejo que nunca se modifique: o refúgio dos sonhos.
com menos imagens: muito menos: vivo uma idade complicada. eu, que já sou complicadinho da silva (sempre assim fui). abdico de cavalgar as nuvens mas é impossível esquecê-las. escondo-me no silêncio dos sonhos. mentindo-me, acreditando em tudo. em tudo, neste tudo tão total e irreal onde tudo se realiza perfeito e, magno exemplo, ninguém sofre e a felicidade campeia. freak forever. mas, precavido, com a puta da laranja no bolso. merda.
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