segunda-feira, 2 de maio de 2011

coisas do Facebook: lagartixas, flores e joelhos perfeitos



o conto As flores, de Mário Rufino, fez-me viajar por mim. lagartixas, flores, joelhos perfeitos, numa amálgama de recordações.
vou transcrever o comentário onde aconteceu, que na 'partilha' feita no meu Facebbok não está visível: não foi na edição original do conto mas numa das (merecidas) partilhas subsequentes. ao caso, na feita por uma amiga facebookeana:

"pensamentos transversais. lembrou-me quando era miúdo, talvez nos meus 8 a 10, não sei bem, em que apanhava lagartixas e amarrava-as pelo rabo a uma caixa de fósforos sem a tampa, com uma pedrita lá dentro para impedi-las de treparem às paredes. e corriam, corriam até que soltavam o rabo que ficava a espernear. o rabo da lagartixa a espernear, e não procuro a palavra adequada a um rabo espernear. não é o importante. talvez seja importante ter sido mau como fui para as lagartixas, que na altura eu não oferecia flores. suspirava-as, suspirava-as quando via a Marília do prédio em frente andar na bicicleta e lhe espreitava o mais-além dos joelhos e suspirava. sem imaginar que talvez umas flores a levassem a emprestar-me a bicicleta e com ela darmos voltas e voltas aos quarteirões das imaginações, presos pela liana dos sonhos que naquela idade nascem quando se suspiram joelhos, mas é-se parvo suficiente para ter medo de gostar de flores e preferir-se amarrar lagartixas pelo rabo.
hoje gosto de flores - aliás sempre gostei mas não o dizia a ninguém. hoje dou flores e certa vez - não há muito tempo atrás - mandei flores silvestres pelo correio a uma deusa d'então, nesse então ainda também musa, apanhadas enquanto continuava a suspirar joelhos e imaginações e dela suspirava e imaginava. julgo que lhe saquei um sorriso lindo e isso é tão importante como um beijo, tanto como uma volta ao quarteirão dos sonhos. recordo-me que entretanto, no entretanto que vai desde as lagartixas às flores postais, cresci e vagueei entre flores, outras flores. do mal, dirão os detractores de Baudelaire, do bem dirão os cultores de Leary ou de Kerouac. foram as flores de mim e foi um
flowerpower onde não me perdi, mas fumei-o de ponta a ponta, fumei-o sim. inalei jardins inteiros, escalei árvores proibidas - e nelas nunca mais vi lagartixas! - e, hoje, a canga das cãs em cima, não enrubesço ao lembrá-lo. não. ainda tenho musas, ainda sonho joelhos perfeitos, e sorrio ao lembrar o tempo das lagartixas, sorrio ao lembrar-me de mim.
Marquez diz que vive para contá-la; o meu minúsculo eu suspira e oferece flores neste tempo em que oferecê-las é tão importante como contar dum sonho. é materializá-los nem que em inócua e ineficaz caixa postal que, aberta, revela bem murcho mas presente que alguém lembrou alguém, que do passeio do outro lado da rua um puto suspira quando entrevê o borboletar dos corações espreitando na brisa que tudo arregaça quando se pedala o crescer."


the end of the story.

2 comentários:

maria joão alfaia mendes disse...

Surpresa boa! Obrigada!
abraço amigo
maria joão

Maria Isabel Ribeiro Rocha disse...

Carlos é sempre bom ler-te.
Obrigado, por este momento... lagartixas eram sim, nossa companhia no grande quintal, mas chorávamos quando por acaso ficavam com o rabo a rabiar decepado por qualquer pequeno acidente... sabes o o rabo delas volta a crescer? assim me diziam e me recordo uma em particular que tinha dois... nos encantava o quintal... entre o jardim e a horta...