sexta-feira, 8 de abril de 2011

insolúvel

posso utilizar a porta de trás, o que me leva a atravessar 'a garagem' onde tenho a livralhada. nos últimos dias evito-a, assim como não a tenho procurado nos serões onde era uma companhia nada silenciosa e agradável. agora não é.

não consigo encarar a minha biblioteca. ou que ela me encare. há acusações mútuas em excesso, que tanto eu como ela temos cara e não somos totalmente inocentes: formamo-nos, amamo-nos, e neste momento acho que nos odiamos: cada roubou ao outro demais para que isso não se leia em cada lombada cheia de silêncios pesados.

toda a vida construí mitos. eu próprio sou uma construção que fui moldando conforme necessitei. não camaleão, mas carapaça em cima de carapaça até este peso do conjunto m'entaremelar o amor pela mais vistosa e provavelmente a mim próprio a mais querida: a do leitor, a do gajo culto, o intelectual.

a porta da frente é anónima: 1º dtº. vasos nas quinas das escadas, um tapete igual em todos e por escolha e custos do condomínio. óculos, brinco, bigode e barba de-três-dias. é assim. eu julguei que não era assim, e o ódio dos livros é por não tê-lo percebido, e o meu a eles é por não mo terem ensinado. por isso minto-me e fecho os olhos interiores quando insisto, e saio e entro em casa atravessando o passado.

amanhã faço 56 anos. conta a família que até entrar na adolescência eu era "uma casa cheia", e hoje encho qualquer T4 de silêncios. li milhares de livros e ainda não consegui entender porque é que a felicidade só se lê ou se escreve, porque é que para não se ser escritor ou se é mentiroso ou cruza-se em silêncio a armadilhada porta dos fundos...

1 comentário:

Anónimo disse...

puxa...e eu que te mandei mais uma estante deles...livros
th