quinta-feira, 24 de julho de 2008

epistolar múltipla e verde: a Insustentável Leveza d'Ela

Não sei se algum de vocês já teve uma experiência igual. Rica. Das tais para daqui a trinta anos contar aos netos ou à enfermeira de serviço que venha dar-nos a papa ou mudar a fralda.

Como sabeis e provavelmente acompanhais com apreensão, 'ela' montou tenda e abriu mochila na 2ª feira e de lá para cá, hoje quinta à noite, compreendi o valor das horas e dos minutos como nunca antes deles me apercebera. A sinfonia de silêncio picotado, de dois a teclarem a dois metros um do outro. O arroto do tinto, seja almoço ou jantar, com eco e gargalhada dupla ao almoço e tripla ao jantar. O duplo olhar de reprovação, ao habitual residente o novel visitante nesta estranha solidariedade feminina que se estabelece em laços que, quando se lhe vêm as pontas já estamos enredados nelas. O caos, o remanso das rotinas recordado com saudade e o verde dos olhos 'dela' que radiografam o íntimo mais íntimo, TAC à alma computorizada e num instante sinto-me tão despido como se estivesse em cuecas.

E não tenho, não conheço, password que me salve ou abrigue - pois careço de ser salvo antes que ou do vinho ou do verde me perca, dalgo que m'abrigue desta sensação que se enraíza de me sentir sultão sem causa e benefício, fora o tchim-tchim com mais um copo erguido presente. Sinto turvar-se-me a razão, se de tal se pode assim falar pois - acusam-me! ela não é de hoje inexistente, é mal d'anos e anos, sedimentado, crustáceos de insanidade que cobrem e tolhem a rocha de se mover.

De se mover. Pois no antes, que há um antes d'ela' e se sóbrio bem o recordo, eu era rocha, penedo e rochedo, à vista desarmada inamovível mas que com jeitinho e empurrão no sítio certo deslizava até acamar num vale que se desse a mostrar como aprazível a tais descansos, o colo da montanha onde me sentava e ronronava ao vento e às árvores, a água que corria lá de cima e agora me beija as beiras da base-rocha era translúcida e brilhava como prata quando o Sol me e nos encandeava. Hoje, se líquidos vejo, são turvos e tintos, e só por cortesia e mentira de escanção que não sou, que o ergo à luz e lhe adivinho e proclamo coisas de que nada sei, pois nada sabia antes 'dela' chegar. Estão lá, alinhadas no balcão e contam-se bem: vai em quatro e de verde transparente pois vazias se tornaram num ai que se vão elas.

E foram. E fui. E caí, rolei o rochedo que pairava eremita e ele acamou-se no verde dos seus olhos, ora mais brilhantes que nunca pois as castas e seus taninos favorecem-lhe a cor. Rolei e ergui a taça, vai acima e vai abaixo, ploc! ploc! as rolhas saltam esmagadas pelo rolar penídeo a que me achava incapaz, insuspeito inapto, falso imóvel inamovível afinal fraco e trôpego após o quarto copo de tinto. Eis, eis-me em cuecas no TAC.

Sorrio e até gargalho. Do primeiro ricto tinha lembranças mas do outro, o excesso, já não me recordava. Etílicas reacções, eventuais saudades dum tempo em que apenas dos vales conhecia as ilusões de olhá-lo(s) à distância sem molhar os lábios no seu ribeiro. Hoje, turvo, em líquidos estou pleno. E se lastro há é a chama verde que refulge e brilha como sardaniscas ao sol quando a mão cumpre o hábito e o ritual saca-rolhas trabalha como nunca o supusera ter de fazer. Alinham-se os troféus, Óscares verde transparente, botelhas altivas e orgulhosas, ainda frescas e sem os rótulos ressequidos pelo esquecimento e pelo tchim-tchim mortal, o derradeiro, o do vidrão. Agora persistem a olhar-me, lá, alinhadas, cada uma lembrando-me exactamente de todos os pormenores que a levaram à verde nudez. À minha cuecas-nudez. 'Ela'. Ela que veio e no mansinho rolou-me e deslizei encosta baixo, do regaço das nuvens caí no colo do vale onde há um ribeiro que sempre supus límpido e sem sabor além do arrepio da frescura e deu-se-me todo, copo a copo tchim-tchim a tchim-tchim em tez tinta e com o sabor acre de ser-se e dar-se maduro.

O verde acompanha no deslizar um a um, o verde olhar e o verde final da garrafa seca sem um pingo que sobre pois neste rolar de louco gargalhado viro viro-a e reviro-a, bato-lhe o fundo e é no fundo que sorvo, sorvemos as gotas tintas dum mundo que é verde e eu nunca tinha disso reparado. É bom, faz bem. Renova stocks, quer de rótulos quer de rolares, desliza-se e visitam-se campos que na solidão do alto do monte as nuvens não deixavam que se vissem com nitidez. A turva e ébria nitidez do céu que era azul e no rolar foi esquecido, ficou lá longe e tornou-se irrelevante quando se cai em colo de ribeiro assim.

Agora vejo, vejo e vejo-me e estou nu, nu fora as cuecas e o tchim-tchim, fora os rótulos e o verde que se alinha como Óscares que não sabia existirem pois nunca lhes tirara a rolha, este ploc denunciador que se repete gargalhado, verde que te quero verde, almoço jantar ou serão, tinto serão senão não e não há bela sem senão, mal digo não pois quero é fazer e dizer sim, tchim-tchim e mais tchim-tchim. Hajam dias, tardes, serões, almoços e ocasiões, que se prolonguem mais uns dias e o tal nirvana acontecerá. Sinto que nunca estive tão perto dele pois o engano era das alturas, quando o verde do engarrafado que se ploc e bebe está lá em baixo e só no pós 'ela' vir e malandra tentar e tentá-lo tentando-me, o descobri e desrolhei, rolei e acamei.

E daqui não saio, vou-me a outra que quero ver-lhe a cor quando ficar translúcida, se irmã das outras ou esta prémio especial, Óscar verde ou não verde o que é certo é que é tinto e, agora, já as mãos a acariciam preparando-a para a incisão do enroscado, o puxão e o ploc das perenes felicidades. Saúde! Tchim-Tchim!

Hic-web, happy como é raro ver-me, mais a mais assim com calores de cuecas tintas.

entre 24 e 25 de Julho, algures por aí.

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