domingo, 29 de junho de 2008

afinal onde é que eu 'nasci'?

ando com "dúvidas exitencialistas". nada de novo para quem me conhece e atura: sou uma espécie de 'adicto' a alimentar problemas que não existem. não existem? será? bem... neste caso trata-se da questão burocrática de, sendo obviamente português cá e em qualquer parte do mundo onde me desloque com a papelada que trago no bolso, se serei moçambicano em Moçambique, já que desde 2004 a sua lei da nacionalidade contempla a "dupla". e que eu acho merecer e desejo ter.
num mega-site moçambicano, o Imensis, no seu Fórum, e aproveitando uma 'discussão' sobre o tema já aberta por outro participante, coloquei a minha interrogação na esperança que mente juridicamente esclarecida e pacientemente versada em ajudar sujeitos atreitos a crises existenciais, possa esclarecer-me.
claro que, como infelizmente já é vulgar em mim, ligando o turbo nunca mais páro e toca a rebolar pelas linhas abaixo como se elas fossem as Barreiras que vão do Liceu Josina Machel até à mata em frente FACIM e, mesmo chegando lá abaixo e dando com o cu no chão, ainda me farto de esgravatar à procura de mais uma palavra que seja a final, que sempre me vejo aflito por desenterrar. daí aí vai lençol, enfim, a 'seca' que os tontos do tac-tac no teclado pregam a quem não tem mais nada que fazer que lê-los.
a minha (tripla) mensagem foi colocada lá só ontem e hoje ainda não há respostas. nada de desanimador, até porque ainda não tenho a mala feita. entretanto, e por e-mail, mandei o link a lista seleccionada que supus que, ou me pudessem auxiliar, ou dar-me uma palavra seja ela de conforto ou de desengano duma vez por todas. ou confirmativa do loucura que me suspeitavam e desta vez viam confirmada. recebi até à bocado quatro respostas.
duma respingo o excerto abaixo da minha contra-resposta, pois na que recebi li dúvidas sobre a legitimidade do meu sonho/pretensão, quer pela desilusão pessoal de quem fez a viagem dos mamutes e dela regressou desiludido, também pelo avançar do burocrático pormenor de lá não ter vivido até fazer a 1ª classe. sendo de um xamuar que até me envaideçe tratando-me por xamuaringa, fiquei perplexo e até um niquito triste. porque eu acho que a nacionalidade sente-se primeiro de tudo. um analfabeto que não saiba ler as palavras inscritas no seu Bilhete de Identidade e que atestam a sua nacionalidade, não o é menos lá dentro que aquele que as lê de trás prá frente.
mas o meu problema é duplo, ou seja o que gostava de possuir era a tal "dupla": acontece que eu também me sinto português, e com a suficiente aclimatação e orgulho de que não querer prescindir de sê-lo e dá-lo de barato assim de repente. há toda uma vida de razões: toda a minha formação cultural, familiar, académica, foi sob essa bandeira, costumes, qualidades e defeitos. e não desprezo quer os meus últimos trinta e tal anos cá residente - e que tanta coisa boa me proporcionaram , tal como, embora mal disso me lembre, os meus primeiros sete, também 'cá', que não devem ter sido maus pois é a idade em que o conceito de mau ou bom tem suporte fácil e naturalmente agradavelmente infantil, sendo que essa deve ser a melhor idade de todas: nickles de preocupações que vão além das brincadeiras e de amigos para elas, uma ou outra esfoladela nos cotovelos ou nos joelhos.
mas acontece que me sinto igualmente moçambicano, embora de forma que até a mim se me afigura como confusa: quando sobre isso matuto muitas vezes temo estar a misturar sentimentos e na mesma panela caldeirar duas nostalgias que são distintas, pese a sua génese e existência terem sido comuns - talvez por isso: a do eu-jovem, que se foi irremediavelmente à excepção de quando me forço ao engano e, psicóloga folha em frente, escrevo escrevo e escrevo sobre o Eu menino e moço, revivendo, efabulando até pois à distância do tempo os pormenores têm a dimensão com que os acarinho e não a do momento em que foram vividos, e em anexo certamente imbuído dos mesmos tiques e lentes vêm os sentimentos nacionalistas, mesmo sendo emoções só misturáveis até certo ponto, como as são: posso exagerar nas derrapagens controladíssimas que fazia na minha motorizada sem ferrar com o rabo no chão, mas sei que não exagero quanto às emoções, à mesma altura, vivi entre o início da revolução portuguesa e me mostrou todo um mundo intelectual novo, mais a fase de 'transição' vivida num red-line que foi delicioso e os quase seis meses após a independência oficial de Moçambique: nesse período fui tão moçambicano como qualquer outro que desde a 8ª geração lá tivesse a famelga toda nascido e crescido: o meu amor e convicção eram iguais e sentia o peito rebentar de orgulho.
depois - e estou farto de contá-lo e contá-lo, já chega e nem me dou ao trabalho de meter links - somaram-se desilusões variadas, tantas que o bolo levou tanta camada que foi-se tornando intragável a cada mordida diária que lhe dava, até que desci armas e engoli o orgulho, juntei-me ao formigueiro cheio de amigos e conhecidos e cá vim parar, Mavalane way.
nas oito (?) horas de voo não tinha certezas de nada. nos trinta e dois anos e picos após a aterrisagem ainda assim estou. estou dividido e, ao que sei, já há desde 2004 solução para patologias como a minha: papelada em ordem e adquire-se o consolo apaziguante da dupla nacionalidade.
por tudo isto - e aproveitando a deixa para terminar senão nunca mais me calo - interrogo-me sobre o que é isso da "nacionalidade". a ele, meu xamuaringa Johny, perguntei-lho assim:
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"não te entendi. porquê? se leste lá no Imensis, também leste que eu nasci 'cá' como bebé chorão, cagão e mamão mas foi lá que me formei como ser humano. com uns acertos depois cá dados, tá claro: viver é um processo contínuo de aprendizagem e por cá ando, nesta 2ª volta, há trinta anos e picos. mas a base da instrução que deu o gajo porreiro ou o cabrãozão que hoje sou foi lá ministrada. dos 7 aos 20, altura em que os poros absorvem tudo o que apanham.
depois muitos cansam-se e fecham-se de barriga cheia e umbigo repleto, gordos, mafutas, convencidos que já aprenderam tudo o que necessitam. o melhor exemplo é o 'bronco', o uga-uga que parou a sua evolução assim que deixou de levar nas orelhas em casa, reguadas nas aulas ou começou a 'cortar-se' a uma valente bulha no páteo da escola - tivesse então essa que nome fosse, pois bulhas há muitas e tive algumas formativas mesmo que sem caneladas ou murros no ar circundante às trombas do 'adversário'.
com muito pouca humildade, felizmente como tu, e que a havê-la seria estúpida por era negar o crescimento constante, evolutivo, digo de mim que mantive pelo menos fifty-fifty dos poros abertos a novas sensações e experiências, além de às carícias das gajas também aos beijos e beliscões da vida. coleccionei o que é de colecionar e rejeitei o que entendi ter de sê-lo - mas com os critérios baseados no tal núcleo matriz, a aprendizagem dos "primeiros verdes anos". afinal onde é que eu 'nasci'?"

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