domingo, 8 de julho de 2007

adenda ao bula-bula de ontem (secção de culinária)

há por aí uma onda de indignação pelos comentários que eu fiz à falta de dotes culinários das donas. até insinuam que eu é só manjar, mas fazer 'tá quieto...
humpff...
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Bem, passado o momento do meu exercício do sacro direito à indignação e à defesa das virtudes, há que reconhecer que tenho uma desconfiança epidérmica dos dotes culinários das miúdas da minha geração. Para continuar a ser verdadeiro e, também, para não correr riscos caseiros, adianto que as razões, se as há além das decorrentes de devaneios filo-mnemónicos, não provêm do hoje pois ainda este almoço manjei um caril de arroz com camarões minúsculos que estava que nem ginjas. Com os agradecimentos directos à Webina, ao Modelo, e à loja do Amaral pois eu não mexi uma palha além de fornecer o transporte para o supermercado onde se comprou o frasco de caril e acompanhei-a esta manhã à loja onde compramos o saquito de anões congelados. A rebuscar em traumas pessoais, no máximo recordo o recorrente arroz branco com ovos estrelados que foi o símbolo gastronómico da estrondosa derrota da "primeira volta" mas, idos tantos anos, nem já deverá contar. E quanto a bolos lá calha um de vez em quando e estamos a entrar na época das gelatinas.
É outra coisa. Sempre que conheço alguma rapariga da minha idade não descanso enquanto não consigo saber daquelas artes, se calhar até descuro outras mas a magia dum aroma irresistível impera, imagino-as nuas e de colher em punho, um delicioso avental por causa dos pingos. E um repenicar estaladiço numa frigideira, sinais de fumo duma panela cheia de mistérios ou a cor a dourar dum assado, tudo erotismos gastronómicos. Não consigo evitá-lo. Há vezes em que até sou chato e pergunto pelos temperos e levo como resposta que o tempo de cozedura é que é importante. E eu calo-me logo, lembro-me de mim afoito a inventar receitas mas sempre à rasca com o relógio, com vontade de ter uma cábula escondida que explicasse mistérios como "... quando estiver no ponto..." ou, mero, "após estar pronto, ...". Arroz são oito minutos, fixei. O resto vai a olho e muita fé na sorte. Pois é. Mas os temperos, a verdadeira arte, aí fazem caixinha e não se descosem, ou reduzem tudo à mais desoladora das simplicidades ou dizem isso já ser matéria de 'segredos', intimidades que não se descosem sem adequado namoro, não é coisa que se partilhe assim, 'segredos', lá vem à memória o ditado que diz que ele é a alma do negócio.
Se puxo a conversa para a área dos doces, então, é uma tragédia. Coram, puxam de paixões & razões fundamentalistas em relação à saúde, fazem-me sentir-me aterrorizado a pensar se esta minha amiga um dia chega a ministra, secretária de Estado. Tudo desculpas: fizeram um bolo aos quinze num concurso entre amigas, ou escolar no bom tempo em que havia para elas lavores e culinária, para eles trabalhos manuais, hoje refila-se da cozinha como eu faço mas também parece ser coisa complicada mudar uma lâmpada, arranjar uma fechadura, alegremente fazer um tuning ao carro que fará pensar à vizinhança que, aqueles, enlouqueceram de vez. Depois lá se casaram e lembraram-se do bolo aos quinze, houve meia dúzia de tentativas mas nem melhoraram ou pelo menos insistem: há muito que os bolos que são bolos, gulosos, vêm de fogões familiares, geração sempre a anterior... A minha sogra faz um 'chifon' que a filha bem tenta imitar mas não consegue. Insiste rapariga, insistam mas é todas! o bolo dos quinze não morreu, ressuscitem-no cá p'ra mesa. Por mim prometo arranjar o pé dela e antes do Inverno calefatar melhor as janelas.
E faço um extraordinário esparguete e uns admiráveis ovos, até me parece que já não está nada mau.

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